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Na senda de comédias como Os Fura-Casamentos, American Pie – A Primeira Vez e Dias de Loucura (com o qual partilha o realizador, Todd Philips), o recém-estreado A Ressaca é uma daquelas comédias politicamente incorrectas, onde os adultos se mostram imaturos como adolescentes e dispostos a tudo por uma boa noite de farra. Este tipo de comédia, depois de ter o seu ponto alto no início dos anos 80 do século passado, voltou a estar em voga em Hollywood, com sucessos como os citados acima e a colaboração de Judd Apatow, em comédias como Virgem aos 40 Anos, Knocked Up – Um Azar do Caraças e Superbad. No entanto, ao contrário das obras produzidas por Apatow, este A Ressaca tem o mesmo género de piadas grosseiras, mas não tem um “coração” por assim dizer (no primeiro seria a cruzada de Steve Carrell; no segundo o despertar para a paternidade; e no terceiro o valor da amizade). Não que esse “coração” faça muita falta ao resultado final.
Doug Billings vai casar. Para comemorar o evento, os seus melhores amigos organizam uma ida a Las Vegas, onde a promessa de muitas tentações embalam os desejos dos últimos dias de um solteiro. O grupo é composto por Doug, Phil, um professor casado, pai de um rapaz e infeliz, Stu, controlado pela namorada possessiva, e Alan, irmão da noiva, que não parece jogar com o baralho todo. Depois de uma noite de arromba, o noivo desaparece e cabe aos restantes três encontrá-lo e tentar perceber o que se passou na noite anterior, uma vez que eles não se recordam de nada. O quarto está virado do avesso, há um tigre na casa de banho, uma galinha, um deles esteve no hospital, outro perdeu um dente e há um bebé também perdido pelo meio. Ao longo do filme vamos sabendo o que realmente aconteceu durante a noite, o que envolve situações absurdas como gangues asiáticas, Mike Tyson, uma prostituta e muito mais. A situação da galinha nunca é esclarecida.
Com uma premissa semelhante ao execrável Onde Tá o Carro, Meu?, A Ressaca vai caminhando na linha ténue que separa o hilariante do estúpido, mas sem nunca tirar o pé do acelerador: as gags sucedem-se a um ritmo altíssimo complementadas pelas hilariantes tiradas das personagens (gosto especialmente daquela em que Heather Graham declara: “Na verdade, eu sou uma acompanhante. Mas achei que a prostituição seria um melhor meio de angariar clientes.”). E se o filme falha na participação descartável de Mike Tyson e na execução de algumas piadas (como aquela do confronto entre Alan e um miúdo, onde a construção da cena é óptima, mas a resolução deixa a desejar), logo se redime com o gangster asiático de comportamento errático, com o exemplar doseamento de uma piada referente a um tripulante de cruzeiro que é repetida em todo o filme e nunca cansa, e… basicamente todas as cenas em que Alan intervém.
Alan, interpretado por Zach Galifianakis numa actuação inspiradíssima, acaba por se tornar no centro do filme e o dono das melhores cenas. Totalmente sem noção e ingénuo, com um complexo de inferioridade em relação ao resto do grupo (reparem no detalhe da verdadeira adoração que ele nutre por Phil) e tentando integrar-se mediante esforços que já nascem fracassados (“Eu era o lobo solitário de uma alcateia…”), Alan é uma daquelas personagens com o qual o público simpatiza de imediato. Ele tem as melhores cenas (a da recepção e a do telhado do hotel) e as melhores tiradas, principalmente duas que se referem a tragédias como o Holocausto e o 11 de Setembro. Mas nada disto funcionaria em pleno se o restante elenco não fosse coeso e os restantes actores exibem carisma e uma química perfeita: Bradley Cooper retrata Phil não como um ser imaturo, mas sim alguém irresponsável preso a uma vida a dois; Ed Helms mostra uma vulnerabilidade para com a namorada que se vai esgotando ao longo do tempo; e Heather Graham representa Jade como uma boa moça à procura do homem ideal.
Desta forma, o público acaba por se deixar conquistar pelo charme destas personagens e pelas situações mirabolantes na qual elas se envolvem, algo que pode ser atestado pela óbvia, porém eficaz montagem final, onde são exibidas fotos do que aconteceu ao longo da noite de folia em Las Vegas. O espectador acaba por rir do choque porque conhece e simpatiza com aqueles quatro indivíduos, deixando a sala de cinema com um sorriso estampado no rosto, seguro que acabara de assistir a uma boa comédia. E isto é mais do que se pode dizer das obras do género actualmente.
Qualidade da banha: 15/20