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Os Descendentes

por Antero, em 25.01.12

 

The Descendants (2011)

Realização: Alexander Payne

Argumento: Alexander Payne, Nat Faxon, Jim Rash

Elenco: George Clooney, Shailene Woodley, Amara Miller, Judy Greer, Beau Bridges, Matthew Lillard, Robert Forster
 

Qualidade da banha:

 

O espectador que entrar na sala de cinema para ver a nova obra de Alexander Payne à espera de uma comédia que os faça gargalhar abundantemente, é por que não tem prestado atenção à carreira do realizador. Mais interessado em fazer estudo de personagens do que em arrancar risos do público, Payne desenha indivíduos normais com preocupações triviais - e, por isso mesmo, profundamente humanas. Em Eleição era a ambição de Tracy Flick; em As Confissões de Schmidt era a crise de terceira idade de Warren; em Sideways era a dependência alcoólica de Miles: seres solitários, alienados daquilo que os rodeia e propensos a desvalorizar as suas qualidades ou tudo o que já haviam conquistado. As ocasionais gargalhadas surgiam naturalmente devido à nossa identificação com o drama daquelas personagens que, de certo modo, projetam as nossas próprias dúvidas.
 
Baseado no livro da havaiana Kaui Hart Hemmings, Os Descendentes traz George Clooney como Matt King, um advogado que mora no Havai e que é o único depositário de um fundo familiar que abrange 25 mil hectares na ilha de Kauai. Quando a família está prestes a firmar um acordo de venda do terreno, a esposa de Matt sofre um acidente de barco e entra em estado de coma. Matt, cuja relação com a parceira não era das melhores, deve então cuidar das duas filhas, a jovem Scottie (Miller) e a adolescente rebelde Alex (Woodley), que nunca foram muito próximas do pai, enquanto lida com o negócio que renderá uma fortuna ao seu clã e tem de decidir se desliga ou não o suporte de vida que mantém a sua esposa.

Usando os cenários do Havai não como postal ilustrado, mas sim para pontuar o clima que quer imprimir no filme, Payne insere as suas personagens num ambiente tropical, mas os seus conflitos são tudo menos pitorescos: Matt tenta reaproximar-se das filhas após o acidente da esposa, mas ironicamente é esta casualidade que os unirá naturalmente e sem recorrer a situações forçadas (não há cá provas desportivas ou musicais para ultrapassar) – o mundo de Matt desaba de vez quando fica a saber do duradouro caso extraconjugal e fica obcecado em saber mais sobre a traição do cônjuge. A partir deste ponto, os incidentes sucedem-se espontaneamente e respeitando os carateres daqueles indivíduos.

O curioso é que nenhum deles é fundamentalmente má pessoa: Brian (Lillard), o amante, poderia ser encarado como um rival de Matt, mas é apenas um homem de família comum que trai a esposa e arrepende-se disso. Mesmo o sogro de Matt, Scott Thornson (Forster), é carrancudo e antipático para com o genro (mas sem exageros) como qualquer sogro seria e isso deriva mais da sua preocupação com a filha (e as suas escolhas) do que propriamente de um choque de personalidades. Até Alex deixa rapidamente os seus lapsos de rebeldia de parte por perceber a gravidade da situação do pai e Scottie é protegida por todos por ainda não ter maturidade suficiente para assimilar o que se passa à sua volta, exatamente como alguém faria com uma criança de tenra idade. Mesmo o estouvado Sid revela-se alguém com uma sensibilidade insuspeita com o decorrer da história.
 
No entanto, é o cuidado com que Matt é desenvolvido que garante o sucesso de Os Descendentes: ator com um carisma inesgotável, Clooney faz com que simpatizemos instantaneamente com Matt e, apesar de ser um pai ausente e um marido distante, compreendamos a complicada situação para que foi atirado. A sua demanda em tentar atingir algum tipo de resolução antes que a esposa faleça é comovente e Clooney é sensível ao retratar o desgaste dos seus problemas emocionais e familiares e, melhor ainda, tem a inteligência de transparecer uma subtil ambiguidade na cena em que questiona os sentimentos de Brian pela sua esposa: se ele o faz para saciar a sua curiosidade sobre um possível futuro da relação entre os dois, por outro lado percebe que a mesma estaria sempre destinada ao fracasso por causa do estado clínico dela (saber a resposta nunca faria a diferença). Um papel que só poderia recair num experiente ator e um erro de casting aqui poderia pôr tudo em causa.

Payne acompanha todos estes intervenientes de maneira fluida e sóbria: vemos em detalhes a vida emocional de Matt em cacos e percebemos as implicações que envolvem o processo de venda dos terrenos – e, sem forçar muito, Payne mostra-nos que ambas estão intimamente ligadas. Além disso, o realizador tem algumas boas ideias como aquela em que ele desce a câmara para dentro de uma piscina e segue a reação de Alex à notícia do acidente trágico. Com uma lição de moral já batida, mas bem empacotada, Os Descendentes encerra-se numa nota esperançosa e acreditamos que as provações que aquele lar passou nos últimos dias poderão ser ultrapassadas: basta que permaneçam unidos.

publicado às 22:58


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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