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Ontem fiz algo que pretendia fazer há muitos anos, mas nunca tive oportunidade: uma sessão de cinema dupla. Aproveitando a estreia de dois filmes, que pretendia assistir, na mesma semana, lá arranjei um tempinho para me sujeitar a mais de 4 horas de cinema. Seguem as minhas impressões sobre cada um dos filmes:
O Incrível Hulk
The Incredible Hulk
5 anos depois da adaptação ao grande ecrã comandada por Ang Lee, chega agora aos cinemas um novo filme que muito pouco tem a ver com o que lhe antecedeu. O Incrível Hulk não é uma continuação directa (actores, argumentista e realizador são diferentes) nem tão pouco um remake de Hulk. Seguindo a lógica de que os espectadores já estão familiarizados com as personagens e as suas relações, o filme reconta a origem do herói maldito da Marvel Comics (durante os créditos iniciais), permitindo que a história arranque mais rapidamente. Bruce Banner está no Brasil isolado daqueles que conhecia, embora mantenha contacto com um tal de Mr. Blue, de modo a encontrar uma cura. No entanto, o General Ross continua com os seus esforços para encontrar e capturar Banner, com o objectivo de utilizar o seu sangue contaminado de radiação gama para reactivar o programa do super-soldado, do qual o Capitão América é o resultado mais famoso (isto não é mencionado no filme, mas um pouquinho de cultura dos comics nunca fez mal a ninguém).
Apesar da narrativa se concentrar mais na acção do que no aprofundamento das personagens e das suas motivações, o filme consegue ter os seus méritos: Edward Norton surge bem melhor que Eric Bana no papel de amargurado Bruce Banner, desta vez há um vilão à altura da força e descontrolo do Hulk (Tim Roth, com uma loucura adequada ao papel) e a história consegue ser mais empolgante que no filme de 2003, que por vezes se arrastava demais. Quanto ao restante elenco as alterações não melhoraram grande coisa: Liv Tyler não é nenhuma Jennifer Connely (tanto em actuação e beleza) e William Hurt não consegue fazer esquecer o General Ross vivido por Sam Elliott.
Não tendo a complexidade do filme anterior, O Incrível Hulk consegue superá-lo num ponto que pareceu estar ausente em 2003 e que, porventura, foi decisivo na reacção fria que o filme recebeu aquando o seu lançamento: as sequências de acção são espectaculares e muito bem encenadas. Nada daqueles cortes rápidos e confusos em que não se percebe do que se passa (alguém disse Transformers?), com realce para o embate que se trava num jardim e para o clímax, que parecem saídas de uma história de quadradinhos. Aliás, todo o argumento parece uma boa revista de banda desenhada: sem rodeios, com tudo muito compacto e, o melhor, cheio de referências a personagens que povoam o mesmo universo das revistas (Tony Stark, o Homem de Ferro, aparece no final do filme, numa cena que é consequência directa daquela pós-créditos de Homem de Ferro).
Durante meses, andei a dizer que O Incrível Hulk seria um filme fraco que, não respeitando o anterior (o que não acontece, ele apenas é diferente) só teria razão de ser para suprimir as necessidades do público jovem, adeptos da acção descerebrada e vazia. Queimei a língua: o filme é um bom entretenimento e mostra que a Marvel Studios está mesmo determinada a acertar no alvo, agora que produz as adaptações das suas próprias criações.
Qualidade da banha: 14/20
O Acontecimento
The Happening
Ao contrário de O Incrível Hulk, andei meses a antecipar, com grandes expectativas, o novo filme de M. Night Shyamalan, que depois do horrível A Senhora da Água, parecia querer voltar ao género que melhor conhece e que lhe deu fama: o suspense. Voltei a queimar a língua: O Acontecimento vem provar que A Senhora da Água não foi um acidente de percurso e que o realizador/argumentista perdeu-se completamente. Narrando uma história em que um fenómeno estranho ameaça a costa leste dos Estados Unidos, cujos habitantes perdem orientação e suicidam-se em catadupa, o filme nunca consegue levar a sua óptima premissa a bom porto.
A primeira meia-hora é boa: toda a construção do suspense é muito bem feita e Shyamalan continua um mestre a filmar cenas tensas e de prender qualquer um na cadeira. Onde o homem falha mesmo é no argumento, que é povoado de personagens com a profundidade de um acetato (mal começa o filme, cada uma delas atira – este é o termo correcto – para o espectador todas as suas preocupações e problemas, de maneira falsa e maniqueísta) que, para piorar as coisas, só dizem coisas absurdas na situação em questão. Os diálogos do filme são, na sua maioria, de doer nos ouvidos: inócuos, ridículos, inverosímeis e disparatados. Destaque para a cena em que Mark Whalberg, totalmente perdido em cena, fala com uma planta (!) ou quando tenta, de forma infantil e risível, fazer ciúmes à sua esposa. Depois temos a montagem: dá a impressão que a película foi retalhada ao máximo, porque cada novo obstáculo que surge é mal desenvolvido (tudo é “resolvido” em pouco tempo) ou não é desenvolvido de todo.
O recurso utilizado em Sinais de fornecer informações às personagens (e ao espectador) através dos meios de comunicação não resulta aqui porque é usado até à exaustão. Já para não falar que as teorias levantadas pelos media não chegam a lugar algum (Acidente nuclear? Terroristas? Desastre ambiental?), servindo para quebrar o ritmo da narrativa e não para criar ainda mais tensão. Além do mais, qualquer pessoa com dois dedos de testa desvenda facilmente o que está por detrás dos estranhos fenómenos. Mas, se não chegarem lá, o filme apresenta toda a mensagem que deseja transmitir nas últimas cenas (uma entrevista televisiva e uma cena passada em França) para que ninguém saia da sala a dizer que não percebeu patavina. Foi-se a subtileza, restando o óbvio e o pretensiosismo de um cineasta que prometeu, cumpriu (um dos melhores filmes da década, O Protegido, é dele), mas deixou que o seu ego inchasse e que o sucesso lhe subisse à cabeça. Não era mal pensado que Shyamalan começasse a apostar em argumentos escritos por outros autores e investisse apenas na realização.
Qualidade da banha: 6/20