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Budas e brutamontes

por Antero, em 16.08.10

O Último Airbender

The Last Airbender

 


Há algumas semanas, teci rasgados elogios neste espaço à carreira brilhante da Pixar, aquela produtora incapaz de falhar e que, na sua demanda de oferecer sempre mais e melhor, acaba por superar-se quando já ninguém o espera. É chegada a hora de falar da Pixar do mal: M. Night Shyamalan. Respeitadíssimo há dez anos, o homem parece que piora de filme para filme. Realizador talentoso, mas longe da boa forma como argumentista revelada nas primeiras obras, Shyamalan é uma escolha incompreensível para comandar este filme. Pior do que isso, só o deixarem meter as mãos no argumento, já que os grandes problemas dos seus filmes anteriores vinham todos da narrativa (não há nada que salve uma má história). Só que, aqui, os problemas parecem vir de todos os lados, o que conduz O Último Airbender ao desastre total.

 

Adaptação da série do canal Nickelodeon, Avatar: The Last Airbender, o filme passa-se num mundo dividido em quatro Nações (Água, Ar, Fogo e Terra) onde um ser, o Avatar, possui a habilidade única de controlar todos os elementos. Desaparecido há um século, Aang é descoberto por dois irmãos e deverá assumir o seu papel de Avatar para travar uma guerra levada a cabo pela Nação do Fogo. Só que o herói abandonou o seu aprendizado por não se sentir confortável com a responsabilidade de ser um predestinado e, de momento, apenas consegue dominar o Ar. Ao mesmo tempo, o herdeiro do trono da Nação do Fogo pretende a sua captura de modo a recuperar o prestígio entre os seus pares.

 

Várias vozes levantaram-se contra o casting de actores caucasianos para papéis declaradamente asiáticos e, quanto a isto, nada posso dizer, já que não vi a série. O que posso afirmar – e isto é algo independente de qualquer etnia – é que os actores são todos péssimos e os diálogos que os servem só têm duas funções: expor, sem a menor subtileza, informações que avancem a história e, pior ainda, tentar fornecer algum indício de desenvolvimento das suas personalidades, algo que o filme falha em toda a linha e transforma-os em pivôs de telejornal a ler um teleponto. Sem o mínimo senso de fascínio ou espectacularidade que uma obra do género exige, O Último Airbender conta com vistosos efeitos especiais que surgem como um espectáculo de pirotecnia vazio, devido à falta de sustentação dramática (a água não parece molhar; as labaredas não parecem queimar os seus alvos e assim por diante).

 

Aborrecido do início ao fim, o filme ainda conta com uma realização pedestre de Shyamalan, cujo ritmo lento e falta de soluções que confiram um mínimo de estilo às cenas de acção, destroem os poucos pontos de interesse, sendo ainda prejudicado por uma conversão 3D inócua (quase dá para acompanhar a projecção sem os óculos) que escurece a fotografia sem qualquer propósito (isto é regra nas conversões tridimensionais). Além disso, o filme bem tenta com que nos identifiquemos com as personagens, mas o seu desenvolvimento é tão pragmático que, quando uma delas é obrigada a sacrificar-se, a reacção da plateia é fria e distante. Em suma, que seja mesmo o último.

 

Qualidade da banha: 5/20

 

Os Mercenários

The Expendables

 

 

A reunião de nomes sonantes dos filmes de acção da década de 80, bem como a adição de alguns deste milénio, é uma mera curiosidade em Os Mercenários. Tire-se o elenco chamativo e não estamos longe do limbo de fitas série Z que gravitam no mercado do directo-para-vídeo. Os heróis absurdamente musculados de outrora e que matavam como poucos exércitos conseguem em filmes regados a muita testosterona são o alvo desta suposta homenagem conduzida por Stallone. Eles são poucos mas matam muitos, o vilão é um ditador de um país latino, a donzela está em perigo, o armamento é de ponta, o sangue vem aos contentores e a acção… bem… a acção pura e dura está lá, mas muito mal encenada.

 

O certo é que Os Mercenários falha naquilo que deveria ser o seu destaque – as sequências de acção. Montadas de forma tão rápida e cheia de cortes que Michael Bay deve ter tido um orgasmo, elas falham também por não permitirem confrontos físicos entre os seus actores e metendo-lhes umas metralhadoras e uns explosivos nas mãos que fazem o serviço todo. Capaz de desperdiçar uma oportunidade única como a luta entre Jet Li e Dolph Lundgreen (que é decepcionante), Stallone deixa-se refém dos piores vícios do cinema de acção actual, onde o sangue é digital (e muito falso), não se compreende nada do que se passa no ecrã e os (d)efeitos especiais são abundantes. Há uma cena em particular que é constrangedora: quando duas personagens se despedem à entrada de um hidroavião, dá para perceber claramente que aquilo é uma composição e que a cena foi filmada recorrendo ao chroma-key. Custava assim tanto filmar num cais e num avião verdadeiro? Exemplos como este há aos montes no filme.

 

Despachado na acção, mas sempre apostado em desenvolver (porcamente) as suas person… perdão, estereótipos, Os Mercenários faz um péssimo uso do seu elenco de “estrelas”. Desde matadores com crises de consciência ao asiático com queda para a comédia (Jet Li mete dó), o filme conta com diálogos tão insossos até para um filme do género, como as piadas frágeis atiradas com a mesma frequência das balas disparadas ao longo da projecção – e quando Stallone diz que Schwarzenegger quer ser presidente, a piada, já de si débil, atira o espectador para fora do filme. Mesmo a tão falada cena da reunião do “Rambo”, do “Exterminador” e do “John McClane” serve mais como uma cena atirada ao acaso e sem qualquer função na narrativa (embora dê para ver que os actores se divertiram imenso ao fazê-la).

 

Sem qualquer sentido de gozo que salve a narrativa (ver Lundgreen a tentar actuar é uma tortura, ainda que seja a gozar com a sua ‘persona’), Os Mercenários ao menos ainda origina alguma nostalgia por vermos aquelas caras tão envelhecidas e, nalguns casos, cheias de botox. Nem mesmo pelo lado da sátira, a película se salva, uma vez que Stallone leva tudo a sério e um tom mais irónico teria tornado tudo mais apelativo e suportável. Feito apenas para render milhões, o filme até pode vir a agradar aos muitos fãs que passaram horas a imaginar como seria uma junção destes “talentos”, mas o resto não deverá ter muitos mais motivos para se entreter com esta homenagem pouco imaginativa.

 

Qualidade da banha: 7/20

 

publicado às 16:03

Sessão dupla

por Antero, em 14.06.08

Ontem fiz algo que pretendia fazer há muitos anos, mas nunca tive oportunidade: uma sessão de cinema dupla. Aproveitando a estreia de dois filmes, que pretendia assistir, na mesma semana, lá arranjei um tempinho para me sujeitar a mais de 4 horas de cinema. Seguem as minhas impressões sobre cada um dos filmes:

 

O Incrível Hulk

The Incredible Hulk

 

 

5 anos depois da adaptação ao grande ecrã comandada por Ang Lee, chega agora aos cinemas um novo filme que muito pouco tem a ver com o que lhe antecedeu. O Incrível Hulk não é uma continuação directa (actores, argumentista e realizador são diferentes) nem tão pouco um remake de Hulk. Seguindo a lógica de que os espectadores já estão familiarizados com as personagens e as suas relações, o filme reconta a origem do herói maldito da Marvel Comics (durante os créditos iniciais), permitindo que a história arranque mais rapidamente. Bruce Banner está no Brasil isolado daqueles que conhecia, embora mantenha contacto com um tal de Mr. Blue, de modo a encontrar uma cura. No entanto, o General Ross continua com os seus esforços para encontrar e capturar Banner, com o objectivo de utilizar o seu sangue contaminado de radiação gama para reactivar o programa do super-soldado, do qual o Capitão América é o resultado mais famoso (isto não é mencionado no filme, mas um pouquinho de cultura dos comics nunca fez mal a ninguém).

 

Apesar da narrativa se concentrar mais na acção do que no aprofundamento das personagens e das suas motivações, o filme consegue ter os seus méritos: Edward Norton surge bem melhor que Eric Bana no papel de amargurado Bruce Banner, desta vez há um vilão à altura da força e descontrolo do Hulk (Tim Roth, com uma loucura adequada ao papel) e a história consegue ser mais empolgante que no filme de 2003, que por vezes se arrastava demais. Quanto ao restante elenco as alterações não melhoraram grande coisa: Liv Tyler não é nenhuma Jennifer Connely (tanto em actuação e beleza) e William Hurt não consegue fazer esquecer o General Ross vivido por Sam Elliott.

 

Não tendo a complexidade do filme anterior, O Incrível Hulk consegue superá-lo num ponto que pareceu estar ausente em 2003 e que, porventura, foi decisivo na reacção fria que o filme recebeu aquando o seu lançamento: as sequências de acção são espectaculares e muito bem encenadas. Nada daqueles cortes rápidos e confusos em que não se percebe do que se passa (alguém disse Transformers?), com realce para o embate que se trava num jardim e para o clímax, que parecem saídas de uma história de quadradinhos. Aliás, todo o argumento parece uma boa revista de banda desenhada: sem rodeios, com tudo muito compacto e, o melhor, cheio de referências a personagens que povoam o mesmo universo das revistas (Tony Stark, o Homem de Ferro, aparece no final do filme, numa cena que é consequência directa daquela pós-créditos de Homem de Ferro).

 

Durante meses, andei a dizer que O Incrível Hulk seria um filme fraco que, não respeitando o anterior (o que não acontece, ele apenas é diferente) só teria razão de ser para suprimir as necessidades do público jovem, adeptos da acção descerebrada e vazia. Queimei a língua: o filme é um bom entretenimento e mostra que a Marvel Studios está mesmo determinada a acertar no alvo, agora que produz as adaptações das suas próprias criações.

 

Qualidade da banha: 14/20


 

O Acontecimento

The Happening

 

 

Ao contrário de O Incrível Hulk, andei meses a antecipar, com grandes expectativas, o novo filme de M. Night Shyamalan, que depois do horrível A Senhora da Água, parecia querer voltar ao género que melhor conhece e que lhe deu fama: o suspense. Voltei a queimar a língua: O Acontecimento vem provar que A Senhora da Água não foi um acidente de percurso e que o realizador/argumentista perdeu-se completamente. Narrando uma história em que um fenómeno estranho ameaça a costa leste dos Estados Unidos, cujos habitantes perdem orientação e suicidam-se em catadupa, o filme nunca consegue levar a sua óptima premissa a bom porto.

 

A primeira meia-hora é boa: toda a construção do suspense é muito bem feita e Shyamalan continua um mestre a filmar cenas tensas e de prender qualquer um na cadeira. Onde o homem falha mesmo é no argumento, que é povoado de personagens com a profundidade de um acetato (mal começa o filme, cada uma delas atira – este é o termo correcto – para o espectador todas as suas preocupações e problemas, de maneira falsa e maniqueísta) que, para piorar as coisas, só dizem coisas absurdas na situação em questão. Os diálogos do filme são, na sua maioria, de doer nos ouvidos: inócuos, ridículos, inverosímeis e disparatados. Destaque para a cena em que Mark Whalberg, totalmente perdido em cena, fala com uma planta (!) ou quando tenta, de forma infantil e risível, fazer ciúmes à sua esposa. Depois temos a montagem: dá a impressão que a película foi retalhada ao máximo, porque cada novo obstáculo que surge é mal desenvolvido (tudo é “resolvido” em pouco tempo) ou não é desenvolvido de todo.

 

O recurso utilizado em Sinais de fornecer informações às personagens (e ao espectador) através dos meios de comunicação não resulta aqui porque é usado até à exaustão. Já para não falar que as teorias levantadas pelos media não chegam a lugar algum (Acidente nuclear? Terroristas? Desastre ambiental?), servindo para quebrar o ritmo da narrativa e não para criar ainda mais tensão. Além do mais, qualquer pessoa com dois dedos de testa desvenda facilmente o que está por detrás dos estranhos fenómenos. Mas, se não chegarem lá, o filme apresenta toda a mensagem que deseja transmitir nas últimas cenas (uma entrevista televisiva e uma cena passada em França) para que ninguém saia da sala a dizer que não percebeu patavina. Foi-se a subtileza, restando o óbvio e o pretensiosismo de um cineasta que prometeu, cumpriu (um dos melhores filmes da década, O Protegido, é dele), mas deixou que o seu ego inchasse e que o sucesso lhe subisse à cabeça. Não era mal pensado que Shyamalan começasse a apostar em argumentos escritos por outros autores e investisse apenas na realização.

 

Qualidade da banha: 6/20

 

publicado às 14:09


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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