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Source Code (2011)
Realização: Duncan Jones
Argumento: Ben Ripley
Elenco: Jake Gyllenhaal, Michelle Monaghan, Vera Farmiga, Jeffrey Wright
Qualidade da banha:
Sou completamente fascinado por obras que abordem viagens no tempo. Regresso ao Futuro, O Feitiço do Tempo, os dois primeiros Terminator, 12 Macacos, o mais recenteStar Trek, a quinta temporada da série televisiva LOST ou a curta-metragem 12:01 PM são alguns exemplos de obras que usam o recurso eficientemente, ainda que de diferentes maneiras. Assim, não é de admirar que um filme que mergulhe no conceito de loop temporal como O Código Base me agradasse - como, de facto, agradou. O que eu não esperava era que o filme revelasse uma faceta mais ambiciosa debaixo da sua capa de mero filme de acção para entreter as massas; uma surpresa que se desvaneceu ao ver o nome do realizador: Duncan Jones.
Realizador do óptimo Moon - O Outro Lado da Lua, uma ficção científica minimalista, mas extremamente ambiciosa do ponto de vista temático, Jones abraça novamente o mesmo género e, munido de mais recursos, conta a história do militar Colter Stevens (Gyllenhaal) que acorda numa viagem de comboio à frente de uma mulher (Monaghan) que não conhece. Aos poucos, Stevens percebe que integra uma operação experimental que consiste em ocupar o corpo de um dos passageiros do comboio durante oito minutos. A missão é descobrir uma bomba e o terrorista que a armou antes que ocorra uma violenta explosão mesmo às portas de Chicago.
Isto tudo acontece nos primeiros minutos de O Código Base e a prudência impede-me de revelar mais detalhes, mas basta referir que o conceito que sustenta o projecto que dá nome ao filme é intrigante o suficiente (ainda que absurdo) e dispara para assuntos habituais da ficção científica como viagens no tempo (ou, mais precisamente, transposição de consciências) realidades paralelas e projecções mentais. Ainda assim, a história é simples de acompanhar uma vez lançadas as regras do jogo e Jones segura-a com mão firme ao estabelecer um clima de urgência que mantém o espectador preso na cadeira, ao mesmo tempo que extrai da premissa discussões como os limites da Ciência, a eterna batalha entre o Livre Arbítrio e o Destino e a imutabilidade do tempo. Este tipo de questionamentos é a base dos melhores exemplos do género, nos quais um conceito absurdo (ou mesmo impossível) permite inúmeras aplicações no mundo real.
No entanto, nada disto teria o mesmo impacto caso não nos importássemos com as personagens e Jake Gyllenhaal faz um bom trabalho ao transmitir toda a confusão do Capitão Colter Steves ao ser confrontado com a difícil missão que tem em mãos, conseguindo ainda injectar imensa humanidade no sujeito (o que torna-se ainda mais admirável depois da tentativa falhada de o transformarem num herói de acção em Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo). As belas Michelle Monaghan e Vera Farmiga também se destacam: a primeira com uma excelente química com Gyllenhaal e a segunda a exalar, inicialmente, a segurança que alguém do seu posto deve ter ainda que, com o passar do tempo, venha a compreender o drama vivido pelo protagonista. A fechar o elenco principal vem Jeffrey Wright que serve como um manual de instruções para o espectador sobre as teorias científicas que movem a acção.
Prejudicado por um desfecho demasiado longo na tentativa de amarrar a narrativa (algo que faz eficazmente), O Código Base é daqueles exemplares cada vez mais raros de entretenimento com cérebro e que não tem medo de desafiar a inteligência do espectador ao mesmo tempo que não descura a sua vertente mais comercial. Engenhoso nas ideias e exemplar na execução, Duncan Jones é mesmo um realizador a ter debaixo de olho.
É incrível, mas é verdade: entre as dezenas de adaptações de videojogos levadas às salas nos últimos 20 anos não há uma minimamente decente. Já não peço uma obra-prima, mas um filme razoável. Nem isso. Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo é a nova investida no género e mais uma página virada sem glória. Percebem-se as intenções: tentar repetir a fórmula que fez a fama de Piratas das Caraíbas (não por acaso uma adaptação de uma atracção de um parque de diversões), chamou-se o prolífero Jerry Bruckheimer que, para cada boa obra que entrega, comete uma mão cheia de atentados e recrutou-se Mike Newell, cuja última incursão nas grandes produções foi com Harry Potter e o Cálice de Fogo, o melhor capítulo da série cinematográfica. Porém, todos os valores à disposição do filme de pouco ou nada serviram. Ainda não foi desta que um videojogo deu direito a um bom filme.
Iniciando-se com uma pomposa narração sobre o Destino, Príncipe da Pérsia conta a história do mendigo Dastan que é adoptado por um rei Sharaman admirado pela bravura e carácter que o jovem demonstrou. Anos depois, o exército persa liderado pelos filhos do rei, Tus e Garsiv, e pelo seu irmão, Nizam, prepara-se para invadir a cidade sagrada de Alamut. Desejoso de provar o seu valor na batalha, Dastan auxilia a invasão e conhece a princesa Tamina, cuja função é guardar a Adaga do Tempo que permite ao seu portador recuar no tempo e subjugar o passado conforme as suas pretensões. Nisto, o rei Sharaman é assassinado e Dastan é dado como culpado, o que o levará a fugir com Tamina e tentar provar a sua inocência, bem como proteger as místicas Areias do Tempo.
Filmado com absoluta preguiça por Newell, Príncipe da Pérsia é todo ele um videojogo dos pés à cabeça e menos um filme: depois de ultrapassado um obstáculo passa-se para o nível seguinte (foge dos guardas, recupera a Adaga, salva a donzela, recupera a Adaga, foge dos mercenários, salva a donzela, enfrenta o vilão, recupera a Adaga que teima em perder-se, salva a donzela que não pára quieta…) ; as informações são disparadas à medida que o tempo passa (somos informados de um sacrifício que Tamina terá que se sujeitar, mas depois não há seguimento quanto a isto); a Pérsia vista aqui abrange vales com construções monstruosas, desertos com dunas majestosas e até uma montanha onde neva bastante, e não deixa de ser cómico que para um Império que vai da China ao Mediterrâneo, todos estes lugares estejam a poucos dias de distância. Além disso, Newell não consegue explorar os elementos presentes no jogo como as panorâmicas de cada cenário que aqui soam pirosas ou o constante recurso a planos em slow-motion sem nenhum propósito narrativo, ao mesmo tempo que o seu trabalho é sabotado pela fraca direcção de arte, cujas coreografias das lutas revelam que tudo aquilo não passa de um cenário, e os efeitos não tão especiais que abundam pela projecção.
Por falar em sabotagem, crime maior é cometido pelo elenco. Ben Kingsley telegrafa para o espectador mal aparece todas as suas intenções; Jake Gyllenhaal é bom actor, sem dúvida, mas não tem o perfil de herói de acção nem consegue segurar uma grande produção, ao passo que Gemma Arterton é bela, mas é zero em presença e em química com o seu par romântico. Para piorar, as alfinetadas que ambos trocam são irritantes, mas nada se compara à chatice que é a insistência de Newell em apostar nas cenas que o casal está para se beijar e são interrompidos no último momento. Assim, o único que se destaca é Alfred Molina como o “empresário” Sheik Amar que, com a sua leveza e críticas à aristocracia, diverte-se a valer e rende as (poucas) gargalhadas do filme.
No mais, o filme conta com uma montagem caótica que mal dá oportunidade de perceber a geografia e o intervenientes das sequências de acção (mas nada que chegue ao extremo mau gosto de Michael Bay, o que já é um alívio), enquanto assassina a fluidez da narrativa ao fazer cortes incompreensíveis no meio das cenas - como no instante em que uma tempestade de areia colossal surge do nada para atacar Alamut, num plano que dura poucos segundos e que, bem explorado, podia carregar na espectacularidade que o filme tanto carece. Sim, porque apesar de nos berrar "Épico! Épico!" aos ouvidos, Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo é seco e calmo como um deserto sem ponta de vento.
Qualidade da banha: 7/20