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Pirates of the Caribbean: On Stranger Tides (2011)

Realização: Rob Marshall

Argumento: Terry Rossio, Ted Elliot

Elenco: Johnny Depp, Penélope Cruz, Geoffrey Rush, Ian McShane, Kevin McNally, Sam Claflin, Astrid Berges-Frisbey
 

Qualidade da banha:

 

Johnny Depp sempre foi um actor respeitado, mas até ao primeiro Piratas das Caraíbas não era um nome sonante para arrasar nas bilheteiras. Com críticas favoráveis, nomeação para o Oscar no bolso e muitos milhões rendidos, Depp passou a ser sinónimo de dinheiro em caixa e a sua carreira disparou até à estratosfera. E tudo graças a Jack Sparrow, o pirata afectado, de andar trôpego, com uma lata descomunal e uma energia inesgotável que elevou a outro nível um entretenimento razoável como A Maldição do Pérola Negra. Como tudo o que faz dinheiro é para repetir, as sequelas não se fizeram esperar e se em O Cofre do Homem Morto a prestação de Depp já não tinha a mesma frescura do original, o filme ainda conseguia injectar mais espectacularidade e surrealismo à série, além de trazer novas e fascinantes personagens – e a qualidade da mesma só veio a decair com o terceiro capítulo, Nos Confins do Mundo, que trazia uma história desnecessariamente complexa, uma infinidade de personagens e uma overdose de efeitos especiais a inchar a película até ao insuportável. Uma queda que se verifica em maior grau neste aborrecido e desinspirado Por Estranhas Marés.

 

Sem incluir muitas das personagens da trilogia original, o novo Piratas das Caraíbas traz mais uma vez Jack Sparrow (Depp) em busca da mítica Fonte da Juventude que também é almejada por espanhóis e britânicos - além do pérfido Barba Negra (McShane), cuja alegada filha, Angelica (Cruz), é uma ex-amante de Sparrow. Ambos terão de unir forças (e trocar farpas) para atingirem os seus objectivos que também são partilhados pelo capitão Barbossa (Rush), agora um corsário ao serviço da Coroa Britânica, e que tem contas a ajustar com Barba Negra, responsável por arrancar-lhe a perna direita.

 

Cientes dos problemas das duas obras anteriores, os argumentistas repetentes Ted Elliot e Terry Rossio constroem um enredo mais simplista e directo e o incrível é que, nas mais de duas horas de duração, não há um único detalhe que não seja dissecado até à exaustão pelas personagens, num cansativo e repetitivo exercício de exposição de novas informações sobre a missão em causa. Chega a ser cómico: há uma sequência de acção a cada 15 minutos e, nos tempos "mortos", ocorre uma verborreia colossal sobre o que fazer, como fazer, quando fazer, o que evitar, que faz aquele, o que está ali, por que faz aquilo, por que não faz de outra maneira, o que pode acontecer, o que acontecerá, o que aconteceu (esta é fácil: escritores preguiçosos)... enfim, uma costura de dados relevantes a comentar o que acontece em vez de estabelecer a acção que não deixa margem de imprevisibilidade para o espectador. Inacreditável é que, no meio de tanto esforço para não deixar nada de fora, a dupla se esqueça de responder a questões importantes, tais como: quem é aquele indivíduo que surge no início, que profecia é aquela que reside sobre Barba Negra ou o porquê de "esquecer" a armada espanhola durante grande parte da história para os ir resgatar no momento mais conveniente ou o porquê de um soldado (preparem-se!) abandonar as suas armas numa mesa enquanto persegue Sparrow que prontamente pega nelas e segue a sua fuga.

 

Preguiçoso até nas cenas de acção, Por Estranhas Marés encena os duelos de forma burocrática, confusa e ofensivamente desleixada: quando Sparrow e Angelica se lançam contra vários oponentes, torna-se quase impossível perceber como eles derrotam os adversários ou como o pirata se desenvencilha tão facilmente de estar atado a uma árvore (as cordas parecem ter folga mais do que suficiente para... bingo!). Além disso, as coreografias das lutas surgem pouco imaginativas e com zero de tensão graças à direcção de Rob Marshall, um realizador sempre pronto a comprovar a sua falta de talento (já vista nos fraquíssimos Memórias de uma Gueixa e Nove). Incompetente ao ponto de deixar que o vilão vá amenizando com o avançar da narrativa, deixando de soar a ameaça que deveria, Marshall não aproveita nem as boas ideias presentes neste novo episódio (como os barcos engarrafados), cometendo ainda o erro de não extrair o mínimo de grandiosidade do trabalho do design de produção, já que o navio do Barba Negra empalidece comparado com o Pérola Negra ou o Holandês Voador.

 

A trabalhar no mais puro dos pilotos automáticos, Depp substitui a graça e a impetuosidade de Sparrow por trejeitos calculados e tiradas frágeis, num reflexo do filme em que está inserido, onde a genuína inspiração dos anteriores (Kraken, Davy Jones, a catarata do fim do mundo, a batalha entre o Pérola e o Holândes) deu lugar ao comodismo e ao enfado (a única excepção é a cascata invertida). Enquanto isso, Penélope Cruz não pode fazer mais do que estar bonita em cena, uma vez que o papel dela não vai além de ser a metade do típico casal que discute a toda a hora mas que se ama, e McShane, com uma entrada cheia de classe, parece ficar constrangido lá para o final, ao passo que Geoffrey Rush até diverte com os modos mais aristocráticos de alguém que responde a um monarca. Para ocupar as vagas deixadas pelo casal formado por Orlando Bloom e Keira Knightley, temos um casal chato até ao tutano formado por um pregador cristão e uma sereia cujas lágrimas activarão a Fonte da Juventude (não perguntem!) – e Sam Claflin revela-se um óptimo substituto para a inexpressividade de Bloom emparelhado com a jovem Astrid Berges-Frisbey num trabalho tão pobre que eu só pensava como o filme beneficiaria com a injecção de carisma e personalidade de Knightley.

 

Surpreendentemente longo e entediante apesar de ser o exemplar mais curto dos quatro e polvilhado de conceitos absurdos mesmo numa série que já viu um polvo gigante (agora temos sereias com toques vampíricos e algo que só posso apelidar de "zombies conscientes"), Piratas das Caraíbas por Estranhas Marés é como uma pastilha elástica mascada eternamente: o primeiro impacto é um sabor adocicado e refrescante mas, em pouco tempo, a mesma torna-se sensaborona e incomodativa.

 

PS: há uma cena adicional após os créditos.

 

publicado às 02:01

O Discurso do Rei

por Antero, em 10.02.11

 

The King's Speech (2010)

Realização: Tom Hooper

Argumento: David Seidler

Elenco: Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham Carter, Guy Pearce, Michael Gambon, Timothy Spall

 

Qualidade da banha:

 

O realizador britânico Tom Hooper parece ter uma queda para dramas históricos: depois de mergulhar no reinado de Isabel I em Elizabeth I, ele comandou a campanha de Lord Longford no Partido Trabalhista em Longford, passando depois pela mini-série sobre John Adams (todos eles para a televisão) e terminando com a ascensão do treinador Brian Clough no óptimo e ignorado Maldito United. Assim, não é uma surpresa que ele tenha produzido um dos filmes mais badalados da actual temporada de prémios que, para não variar, retrata um momento importante da história da monarquia britânica: a renúncia ao trono de Eduardo VIII para se casar com a norte-americana Wallis Warfield (que, duplamente divorciada e o facto de ser uma plebeia, poderia despoletar uma crise diplomática nas rígidas e milenares convenções da Família Real) e a subida ao poder do seu irmão mais novo, Jorge VI, cuja gaguez revela-se um entrave às suas ambições de ser um monarca digno para o Império e para uma Europa ameaçada pela sombra de Hitler.

 

Condensando cerca de 15 anos em questão de meses, O Discurso do Rei inicia com a apresentação pública do Príncipe Alberto (Firth) no Estádio de Wembley quando este deve fazer um discurso que se tornará embaraçoso e patético devido ao seu defeito na fala. A sua esposa, a futura Rainha-Mãe (Carter), não mede esforços para ajudar o marido e, após várias experiências fracassadas, ela decide consultar Lionel Logue (Rush), um peculiar terapeuta da fala australiano, que recorre a métodos pouco ortodoxos, mas eficazes. Aos poucos, Bertie (alcunha do futuro rei) progride, mas não sem vários atritos com Logue que levarão a um estreitamento da amizade entre ambos - e todo este processo será posto à prova com a renúncia de Eduardo VIII e o início da Segunda Guerra Mundial.

 

Inseguro e ridicularizado pelo pai, Bertie está longe da figura que o povo exige de um monarca, o que realmente nunca poderia ser um problema não fosse por uma inusitada conjugação de factores externos – e Colin Firth oferece uma actuação poderosa como um indivíduo que enfrenta sérias dificuldades em expor-se publicamente, seja pelo problema que o aflige ou pelas rigorosas normas de conduta a que está sujeito (que vêm à tona numa cena em que ele desabafa sobre a sua infância, na qual uma educação severa ocultava qualquer traço de inocência ou criatividade). Obviamente desconfortável com a postura informal de Logue, Bertie parece viver num casulo onde cada comportamento é pensado ao pormenor e não admira que ele encare as sessões de terapia como uma humilhação (ainda que em privado), já que é obrigado a manifestar e a tentar superar o seu problema ao mesmo tempo que tem de aturar as tiradas sarcásticas do seu instrutor.

 

Não que Logue seja um mau profissional: de início, o facto de tratar um Príncipe pela sua alcunha poderia mostrar uma faceta arrogante e, quiçá, anti-monárquica (afinal, ele é oriundo da Austrália, colónia do Império Britânico), mas logo se percebe que o ambiente mais descontraído que Logue imprime nas sessões tem como objectivo manter o governante mais à vontade e vincar a sua pouca disposição em rebaixar-se perante a enorme responsabilidade de tratar alguém superior a ele (algo que poderá ter acontecido noutras ocasiões e que o filme deixa implícito). Desta forma, a actuação divertida de Geoffrey Rush oferece um excelente contraste com a inflexibilidade e altivez de Bertie; uma batalha de temperamentos que atinge o auge na sequência do ensaio da cerimónia de coroação, quando uma revelação intíma de Bertie é rebatida com uma acção ousada (e hilariante) do terapeuta.

 

Num filme recheado de primorosas interpretações, destaque para Helena Bonham Carter como a esposa genuinamente preocupada com o problema do marido e compreensiva para com as suas inquietações e o estado da Nação, ao passo que Guy Pearce demonstra, no pouco tempo a que tem direito, o carácter boémio e descomprometido de Eduardo VIII – enquanto Timothy Spall é o único a desapontar com uma caricatura de Wiston Churchill, deixando que a memória da figura já de si estranha do mítico Primeiro-ministro faça todo o trabalho de composição. Por outro lado, Tom Hooper oferece um trabalho sem nenhum rasgo de originalidade, apesar da condução eficiente da narrativa até ao discurso final e de algumas opções acertadas (ainda que óbvias) como recorrer a planos contra-picados para retratar a inadequação social de Bertie ou demonstrar paralelismos entre os aposentos grandiosos da Família Real e o calor humano que exala do escritório/casa de Logue, o que diz muito sobre o futuro Rei: enquanto os primeiros o oprimem e intimam, os segundos fornecem-lhe a paz e o conforto que ele necessita.

 

Alicerçado num elenco em grande forma e em perfeita sintonia, O Discurso do Rei resume-se às suas interpretações, já que a sua história previsível e pouca ambiciosa poderia ter sido adaptada para a Televisão sem qualquer problema – e saber que o filme resiste a este percalço e que isto pouco ou nada reduz a sua força, é algo que deve ser fartamente elogiado e não desprezado.

 

publicado às 20:22


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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