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A polémica não anda aqui

por Antero, em 16.05.09

 

NOTA: não li ambas as obras de Dan Brown referenciadas neste post, portanto sempre que me referir a Anjos e Demónios e a O Código Da Vinci estarei a abordar os filmes e não as obras literárias.

 

Anjos e Demónios é uma melhoria em relação ao O Código Da Vinci: tem muito menos falatório, tem mais acção e consegue aproveitar melhor os locais onde a acção decorre (neste caso, Roma e o Vaticano) embora muitos exteriores tenham sido claramente desenvolvidos em CGI. Por outro lado, consegue cometer os mesmos erros, como a actuação burocrática de Tom Hanks, personagens rasas como um pires, reviravoltas previsíveis e uma tentativa falhada de criar um clima de urgência, apesar do filme saltar de cliffhanger em cliffhanger. Ainda assim, a má fama trazida com a longa-metragem anterior acaba por jogar a favor do novo filme: Anjos e Demónios é uma passatempo mais suportável que O Código Da Vinci, mesmo com a realização sem garra de Ron Howard e o argumento rocambulesco de David Koepp e do péssimo Akiva Goldsman.

 

Situado meses depois dos eventos de O Código Da Vinci (alteração feita por razões óbvias), esta nova película traz a recruta de emergência de Robert Langdon pelo Vaticano, com vista à solução do rapto de 4 importantes cardeais durante o conclave que se realiza para eleger o novo Papa. As suspeitas pairam sobre os Illuminati, uma organização à margem da Igreja Católica que se julgava extinta, que detém em sua posse um pedaço de antimatéria roubado do CERN e que pretendem destruir a cidade do Vaticano. Então lá parte Langdon, juntamente com Vittoria Vetra, no encalço de pistas que os levem a evitar a morte dos 4 cardeais, encontrar a antimatéria e evitar a destruição de parte de Roma. Acham pouco? Pois eles têm até à meia-noite e já só faltam poucas horas para atingir essa meta. A primeira metade do filme parece quase uma extensão da obra anterior: todas as personagens abrem a boca para fornecer um dado histórico ou algo que, convenientemente, sirva a narrativa. Desenvolvimento de personagens, zero. Não se preocupem se se sentirem confusos: eles até podiam dizer que parte do enigma resolve-se no Mosteiro dos Jerónimos, uma vez que nada disso interessa realmente. O que nós queremos é acção e intrigas.

 

Felizmente, acção é o que não falta a Anjos e Demónios. O mesmo já não pode ser dito de acção eficiente, daquela de prender o espectador na cadeira. Não sentimos as personagens realmente em perigo e, uma vez que tudo é prevísivel, é uma questão de tempo (e paciência) até que o filme atinja a nossa linha de raciocínio. Para isto contribui a realização convencional de Ron Howard que, verdade seja dita, pelo menos não torna este filme numa enrolação interminável como o anterior. Porém, de forma a dar a impressão que algo acontece e que a situação é urgente, Howard torna a mínima deslocação a pé ou de carro numa sequência recheada de cortes e tremideira, num recurso tão batido e irritante que só revela o academismo do realizador (aquele Oscar que ele ganhou foi um crime). Mais irritante ainda é a banda sonora de Hans Zimmer que usa e abusa dos coros religiosos, seguindo a velha instrução de que filmes com assuntos relacionados com a Igreja têm de ter partituras com coros religiosos. Nos créditos finais ainda pensei que iria ouvir Era ou Enya, mas não chegou a tanto.

 

Por outro lado, Anjos e Demónios é bem sucedido ao ilustrar a velha discussão entre Religião e Ciência, principalmente ao brincar com a percepção da administração do Vaticano em relação a Langdon devido aos eventos de O Código Da Vinci. Ainda assim, é notório o esforço do argumento em ser o menos polémico possível, tentando agradar a ambas as partes e levantar questões pertinentes sem grande alarido (e, após a exibição, fui informado do parentesco de duas personagens no livro e que é omitido no filme, o que só revela a sua cobardia). Ao propor discussões e não as desenvolvendo para além do que o politicamente correcto permite, o filme torna-se aborrecido e inócuo, apesar de se julgar muito inteligente e relevante. Tambem não ajudam certas soluções como aquelas câmaras de vigilância (um quase deus ex machina) e a cena do helicóptero, que podem resultar no livro mediante uma boa contextualização, mas que no filme são jogadas ao acaso.

 

Autêntico postal de Roma e dos hot spots do Vaticano, Anjos e Demónios é um entretenimento inconsequente, divertido por vezes, mas sem nunca empolgar o suficiente como o thriller que devia ser. A mesma equipa, os mesmos pecados (ainda que com pequenas atenuantes).

 

Qualidade da banha: 8/20

 

publicado às 00:37


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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