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Regresso ao Futuro
Back to the Future (1985)
Realização: Robert Zemeckis
Argumento: Robert Zemeckis, Bob Gale
Elenco: Michael J. Fox, Christopher Lloyd, Crispin Glover, Lea Thompson, Thomas F. Wilson
Qualidade da banha:
"Há filmes que não envelhecem".
Foi este o pensamento que me passou pela cabeça após assistir, pela enésima vez, Regresso ao Futuro, uma pequena jóia dos anos 80 e a obra máxima de todos os envolvidos, desde o elenco, passando pelo argumento, a banda sonora, o design de produção e acabando na realização. Tudo funciona em perfeita harmonia naquilo que eu considero o entretenimento em estado puro. É incrível como, depois de tantos anos, Regresso ao Futuro ainda é uma obra fresca, divertida, empolgante e criativa – e apesar de admirar a trilogia como um todo (nomeadamente, o ritmo alucinante da Parte II e o lado mais dramático da Parte III), é mesmo no primeiro capítulo que a produção se esmera.
A história toda a gente conhece: Marty McFly (Fox) é o típico adolescente norte-americano de classe média dos anos 80. O seu pai, George (Glover), é um falhado que é um quase escravo de Biff (Wilson), a sua mãe é uma alcoólica frustrada com o casamento e os seus irmãos são dois imbecis. Nisto, McFly é contactado pelo seu amigo cientista, Emmet 'Doc' Brown (Lloyd) para acompanhar o teste do seu novo invento: a máquina do tempo na forma de um espectacularmente retro DeLorean. Por engano, Marty recua 30 anos no tempo e acaba por interferir no encontro dos seus pais adolescentes e, pior de tudo, a sua mãe apaixona-se por ele! Agora, Marty terá de fazer com que os seus pais se envolvam sob pena de ele próprio deixar de existir ao mesmo tempo que tenta arranjar uma forma de voltar a 1985.
Dizer que Regresso ao Futuro é o filme fundamental dos anos 80 é não passar muito longe da verdade, uma vez que a dinâmica do mesmo vive muito do contraste entre as gerações dos anos 50 e 80 e das mudanças na cidade de Hill Valley. Os detalhes são imensos e uma única visualização do filme não é suficiente: a sala de cinema local, por exemplo, exibe em 1955 um filme com Ronald Reagan, presidente dos EUA em 1985 (visado numa das melhores tiradas do filme); o shopping Dois Pinheiros em 1985 passa a Pinheiro Solitário após Marty destruir um deles em 1955; a canção Johnny B. Goode (de 1958) de Chuck Berry é praticamente "inventada" em 1955 e referenciada por um tal de Marvin Berry; e por aí vai. O argumento de Robert Zemeckis e Bob Gale brinca com todas as possibilidades de um paradoxo como este em diálogos afiados ("Eu sou Darth Vader do planeta Vulcano!" ou a incapacidade de Doc em perceber as gírias "futurísticas" de Marty) e situações hilariantes (como o desconforto de Marty na presença da fogosa mãe).
Talvez a explicação para o apelo universal de Regresso ao Futuro esteja na possibilidade que Marty tem de presenciar como os seus pais eram na juventude, uma curiosidade com a qual todos nos identificamos e que justifica o sucesso planetário que o filme teve. Ele (e nós) pode compreender como eles mudaram e como os seus objectivos não se realizaram. Além disso, o filme é uma aventura trepidante e os eventos sucedem-se de forma coesa e fluida, como uma corrente com elos intimamente ligados e onde cada personagem diz algo que revelar-se-á importante mais à frente. Tudo tem a sua importância e nada é deixado ao acaso, o que só prova o engenho do brilhante argumento de Zemeckis e Gale.
No entanto, Regresso ao Futuro não teria metade do impacto que teve (e tem) se não fosse por um elenco em perfeito estado de graça: Michael J. Fox encontrou o papel da sua vida como Marty McFly e é impossível pensar em outro actor que não ele (Eric Stoltz foi despedido a meio das filmagens) e Cristopher Lloyd confere imensa energia e um pouco de loucura a Doc Brown, ao passo que Thomas F. Wilson compõe um rufia adoravelmente detestável e Crispin Glover não fez mais nada de jeito depois do seu perfeito retrato do falhado que não consegue reagir às adversidades.
Na parte técnica, mais elogios: a montagem não deixa o pique cair, a banda sonora de Alan Silvestri é mítica, os efeitos especiais da Industrial Light and Magic continuam eficientes e o design de produção faz com que a cidade de Hill Valley seja uma personagem à parte na história, visto que alguns dos pontos altos do filme estão nas alterações que esta sofre ao longo do tempo. Misto de comédia, ficção científica e aventura (e funciona em todas estas categorias), Regresso ao Futuro é um dos ápices de uma década onde a criatividade de jovens realizadores rolava solta e onde o fantástico e o real andavam de mãos dadas em profunda harmonia num entretenimento de primeira água capaz de encantar gerações passadas e futuras.
E que ainda põe no bolso muita película recente, com tecnologia de ponta e cheia de milhões para gastar em publicidade.