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Os Miseráveis

por Antero, em 08.01.13


Les Misérables (2012)

Realização: Tom Hooper

Argumento: William Nicholson, Alain Boublil, Claude-Michel Schönberg, Herbert Kretzmer

Elenco: Hugh Jackman, Russell Crowe, Anne Hathaway, Amanda Seyfried, Eddie Redmayne, Helena Bonham Carter, Sacha Baron Cohen, Samantha Barks, Isabelle Allen
 

Qualidade da banha:

 

Nos melhores momentos, Os Miseráveis consegue ser uma obra arrebatadora e emocionalmente poderosa; nos piores, não passa de um dramalhão cansativo no qual obstáculos são criados do nada para dificultar a vida das personagens e cujas trajetórias cruzam-se de forma preguiçosa e pouco credível. Em suma: uma telenovela.

 

Baseado na versão de língua inglesa do famoso musical francês que, por sua vez, é baseado na obra de Victor Hugo (ufa!), Os Miseráveis acompanha Jean Valjean (Jackman), um prisioneiro a cargo do carcereiro Javert (Crowe) que é posto em liberdade condicional após 19 anos de clausura por ter roubado um pão e inúmeras tentativas de fuga. Ostracizado pela sua condição de ex-presidiário, Valjean desrespeita a lei assumindo uma nova identidade e, anos depois, torna-se num próspero empresário. No entanto, o seu passado tende a persegui-lo e o encontro com a pobre Fantine (Hathaway) despoletará uma série de acontecimentos que marcarão a sua vida.

 

Tentando ser o mais fiel possível à peça que o originou, Os Miseráveis é, nas suas mais de duas horas e meia, praticamente todo cantado: não apenas os números musicais servem para avançar a história, como também as personagens abrem a boca a qualquer momento para expressar o que lhes vai na alma - o que, claro, dá um ar demasiado teatral à narrativa. Assim, o elenco abraça sem receio gestos e expressões convenientemente exageradas para ressaltar o clima de espetáculo que move o filme (contenção é algo nunca visto por aqui). Neste aspeto, a fabulosa galeria de intérpretes não dececiona e dá tudo o que tem (apesar dos dotes musicais de Russell Crowe serem algo duvidosos), com destaque para a transformação física e emocional operada no Valjean de Hugh Jackman e a arrepiante e marcante curta participação de Anne Hathaway cujo número I Dreamed a Dream mostra todo o rancor e sofrimento da sua Fantine, naquele que é o ponto alto da película.

 

A partir daí, Os Miseráveis começa a perder o interesse. Tom Hooper é bem-sucedido a estabelecer as motivações do trio Valjean-Javert-Fantine, mas a condução da narrativa é problemática: talvez por perceber a teatralidade do produto que tinha em mãos, o realizador mexe a câmara de um lado para o outro sem conseguir imprimir energia alguma e, quando o filme se torna numa espécie de "Movimento Occupy: O Musical", ele apela para uma edição rápida que o espetador mal consegue discernir o cenário, os seus ocupantes e a distância entre eles (toda a sequência da barricada é uma aula sobre como não editar cenas de ação). Além disso, Hooper não consegue contornar as limitações do texto original que, com as suas coincidências absurdas e conveniências do argumento (Javert vai de capataz a simples inspetor para acabar como um alto oficial militar – sempre em perseguição de Valjean – sem grandes justificações) não é mais do que uma pomposa novela épica. Tão épica que juro ter ouvido cantar ♫ I Dreamed of Oscars! ♫ OSCARS! ♫

 

Com mão pesada até no subtexto religioso (não basta Valjean ser profundamente católico, ele tem de ser apresentado como um quase Jesus Cristo nas suas últimas horas), Os Miseráveis é irrepreensível nos seus aspetos técnicos: aqui, Paris é uma cidade pobre e imunda, mas ainda assim com traços já característicos, o guarda-roupa é digno de aplausos e o envelhecimento dos atores é convincente. No entanto, o filme não tem brilho – o que é de espantar numa longa história sobre opressão, revolta, liberdade e redenção. Ao final, o festim visual e auditivo proporcionado pelo filme deixara-me cansado e nada extasiado.

 

publicado às 23:41

O Cavaleiro das Trevas Renasce

por Antero, em 02.08.12


The Dark Knight Rises (2012)

Realização: Christopher Nolan

Argumento: Jonathan Nolan, Christopher Nolan

Elenco: Christian Bale, Gary Oldman, Anne Hathaway, Tom Hardy, Marion Cotillard, Mathew Modine, Joseph Gordon-Levitt, Morgan Freeman, Michael Caine
 

Qualidade da banha:

 

Com a difícil tarefa de apagar a má imagem deixada por Joel Schumacher, o britânico Christopher Nolan operou uma verdadeira revolução no excelente Batman: O Início e superando-se no fabulosoO Cavaleiro das Trevasao criar um universo realista, adulto e contemporâneo: Gotham City deixava de ser a cidade fantasiosa onde Batman habita para se tornar o reflexo de qualquer metrópole mundial com os seus problemas de violência e criminalidade ao passo que Bruce Wayne se transformava num indivíduo tridimensional com os seus questionamentos e demónios pessoais. Pois a trilogia encerra-se agora em O Cavaleiro das Trevas Renasce com uma experiência envolvente e épica, ainda que, para ser honesto, a empreitada fique abaixo dos capítulos anteriores.

 

Iniciando-se logo com a apresentação do vilão Bane (Hardy) e os seus atributos (força descomunal, inteligência e a fidelidade que é capaz de inspirar nos seus colaboradores), O Cavaleiro das Trevas Renasce passa-se oito anos desde a morte de Harvey Dent – uma tragédia que, atribuída ao Homem-Morcego (Bale), inspirou a criação de uma lei que, associada aos esforços do comissário Gordon (Oldman), acabou com a criminalidade na cidade. É neste contexto que Bruce Wayne acaba por ter de reassumir o papel de herói depois que a presença de Bane em Gotham é revelada – numa história que envolverá ainda a ladra Selina Kyle (Hathaway), o jovem policial Blake (Gordon-Levitt) e a milionária Miranda Tate (Cotillard).

 

Sempre preocupado em ancorar o seu universo no mundo real, os irmãos Nolan tornam a conclusão no mais fantasioso dos três episódios sem deixar que estes elementos distraiam a atenção (embora o programa capaz de apagar qualquer base de dados seja difícil de engolir) e que sejam integrados de forma orgânica naquele contexto - e muito contribui para esta sensação a opção de usar efeitos visuais práticos e mecânicos, limitando aqueles desenvolvidos em CGI ao mínimo. Assim, Gotham surge como uma cidade naturalmente calcada no quotidiano e, no processo, envolvemo-nos com as agruras dos seus habitantes quando estoura uma situação de calamidade pública. Toda a trilogia, aliás, se poderia denominar como Gotham City, já que é o apego à mesma (e aos seus problemas) que movem as ações de Bruce Wayne, algo realçado pelo facto do argumento remeter para vários pontos de Batman: O Início para desenvolver a sua própria história.


Por outro lado, O Cavaleiro das Trevas Renasce peca por ter personagens e histórias paralelas a mais, o que, claro, incha a duração e faz o ritmo oscilar – e a mais prejudicada é Marion Cotillard cuja filantropa Miranda Tate arrasta-se pela projeção sem dizer a que veio (e quando diz, é tarde demais). Já Anne Hathaway destila sensualidade e pouco mais – a sua Selina Kyle mantém-se interessante por sabermos que é a Mulher-Gato, enquanto Joseph Gordon-Levitt mostra firmeza de caráter e dedicação, Gary Oldman brilha com os remorsos do Comissário Gordon em ocultar a verdade por tantos anos, Michael Caine fica encarregue das cenais mais tocantes pelo carinho que demonstra pelo seu "Menino Bruce", e o cada vez mais impressionante Tom Hardy investe num tom de voz que mistura calculismo, vigor e desprezo refletindo o seu intelecto superior e que faz um ótimo prolongamento ao seu físico imponente.

 

Contudo, o destaque é mesmo Christian Bale que ao longo de três filmes construiu o mais amargurado dos super-heróis: magro e cansado no início do filme (e com o cabelo levemente grisalho, o que estabelece economicamente a passagem dos anos), ele torna-se mais forte e ágil com o passar do tempo, mas não menos trágico: a sua obsessão na luta contra o crime custou-lhe tudo o que ele mais amava levando-se a tornar um eremita – e quanto Bruce assume novamente o manto de Batman, percebemos o quanto lhe custa entregar-se mais à uma vez à sua jornada. A composição sensível de Bale faz com que nenhum outro herói seja tão cobrado física e emocionalmente, o que é realçado pela bela estrutura do argumento que costura várias passagens dos capítulos anteriores para introduzir várias rimas temáticas que aprofundam ainda mais a trajetória de Bruce Wayne, como no momento em que Alfred confessa ter queimado a carta que Rachel havia deixado para o milionário.

 

Todavia, por muito boa que seja a estrutura de O Cavaleiro das Trevas Renasce há aspetos mal desenvolvidos (e aconselho a leitura deste parágrafo apenas para quem já viu o filme): como Bruce conseguiu voltar a Gotham em tão pouco tempo se ele estava falido e tão longe de casa, sendo que a metrópole até estava isolada? E como explicar a falta de lógica do plano de Bane em fornecer "esperança" aos habitantes de Gotham para depois destruir tudo se, para começar, ele mata centenas de pessoas, faz chantagem com o governo e deixa a cidade em estado de sítio? Falando em Bane, é uma pena que a sua despedida do filme seja tão inglória, uma vez que ele sofre do estigma do "supra-vilão que, a poucos minutos do fim, revela-se um mero peão do verdadeiro estratega" numa reviravolta muito batida e nada plausível. E resta dizer que a morte de Miranda é encenada de maneira involuntariamente cómica e, não por acaso, já é objeto de gozo pela Internet.

 

(fim dos spoilers)

 

Com um clima de tensão crescente e empolgantes sequências de ação em grande escala (embora Nolan tenha notórios problemas a montá-las – e isto não é exclusivo deste filme), O Cavaleiro das Trevas Renasce fecha de maneira satisfatória e ambiciosa a trilogia que elevou as obras baseadas em comics para outro nível sem deixar de apontar o rumo para futuras e prováveis sequelas. E que fique claro que quem pegar nisto terá uns grandes sapatos para encher.

 

publicado às 05:45

No país das (poucas) maravilhas

por Antero, em 05.03.10


Tenho muita estima por Tim Burton e os seus universos fantasiosos recheados de humor negro e até mesmo pelos seus filmes mais comerciais (considero o mal-amado Planeta dos Macacos espectacular), mas, desta vez, algo correu mal. Alice no País das Maravilhas é o pior filme de Tim Burton em muito tempo, provavelmente o pior que ele já realizou, onde abundam os efeitos especiais e os cenários maravilhosos, porém tudo sem alma, sem chama, sem o sentido de maravilhamento que deveria estar presente numa adaptação da obra de Lewis Carroll e que Burton trata com o descaso típico do realizador que se rendeu aos devaneios proporcionados pela tecnologia digital. É menos um filme de Tim Burton, mas mais um filme Disney com umas pitadas do realizador de obras como Ed Wood, Eduardo Mãos-de-Tesoura, O Estranho Mundo de Jack ou A Noiva Cadáver.

 

Desenvolvido como uma espécie de sequela das obras literárias Alice no País das Maravilhas e Alice Através do Espelho, o filme conta com Alice já com 19 anos e prestes a casar com um lorde, num arranjo proporcionado pelas famílias de ambos. Quando deve aceitar o pedido de casamento, a jovem hesita e acaba por fugir, indo parar à toca de um coelho, entrada para a Sub Terra ("Underland" no original e não "Wonderland", num detalhe imbecil acrescentado pelo argumento) onde reencontra o Coelho Branco, os gémeos Tweedledee e Tweedledum, a Lagarta Azul, o Gato Cheshire e o extravagante Chapeleiro Louco. No entanto, Alice não se recorda das aventuras anteriores e agora terá de fazer frente à Rainha Vermelha (numa mistura desta com a Rainha de Copas) que se apoderou do trono e devolvê-lo à irmã desta, a Rainha Branca, para que a felicidade volte a reinar no País das Maravilhas.

 

Pensaram em Hook? Pois bem, a base é praticamente a mesma, só que o desenvolvimento está mais para A Bússola Dourada ou As Crónicas de Nárnia: o Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa e tantos outros sub-Senhor dos Anéis que invadiram os ecrãs nos últimos anos. E dá-lhe música épica (Danny Elfman volta a entregar uma partitura fraca), panorâmicas das personagens enquanto percorrem pastos, planícies e montanhas e, para não fugir muito à regra, uma história ancestral do Escolhido contra as forças malignas. Aqui, Alice terá de recuperar a mítica Espada Vorpal para matar um dragão qualquer (esqueci-me do nome) e destronar a Rainha Vermelha. Sim, o argumento é assim tão linear e pouco ambicioso.

 

Por outro lado, o País das Maravilhas (ou Sub Terra como o filme insiste em chamar) é belíssimo, mas Burton nunca nos dá a oportunidade de nos envolvermos naquele universo, deixando que os cenários majestosos façam o trabalho por ele. Ou seja, tudo o que tão bem resultou emAvatarnão se aplica aqui. Mas o mais decepcionante é que Burton abandone o surrealismo e a inteligência da obra de Carroll para abraçar uma aventura de grande escala, onde nem o charme das personagens secundárias recupera a essência original, uma vez que é notória a inclusão do Chapeleiro como personagem importante e não tanto periférica como justificação para o apelo comercial de Johnny Depp.

 

E por falar em personagens importantes, o facto de Alice estar mais crescida não faz diferença alguma no resultado final, já que ela demonstra uma inocência incomum para uma jovem de 19 anos, sendo ainda prejudicada pela fraca actuação de Mia Wasikowska que, além de inexpressiva, surge pouco à vontade no meio de tanto cenário digital (e a cena em que ela se belisca por achar que aquilo tudo é um sonho é, no mínimo, embaraçosa). Ainda assim, Helena Bonham Carter resgata o espírito da Rainha de Copas com imenso sucesso, sendo ainda auxiliada pelos excelentes efeitos especiais que lhe aumentam a cabeça de forma absurda para um corpo tão esguio. Quanto a Johnny Depp, o actor acrescenta mais uma personagem excêntrica à sua já longa galeria, embora não saia do piloto automático, ao passo que Anne Hathaway mal tem tempo para fazer seja o que fôr com a Rainha Branca.

 

Com poucos momentos do humor negro que caracterizam a obra de Tim Burton (os animais vassalos da Rainha ou as cabeças flutuantes que auxiliam Alice a atravessar um leito são momentos isolados), Alice nos País das Maravilhas falha ainda ao não estabelecer nenhum arco dramático para a sua protagonista que, ao final da projecção, não sofre nenhuma mudança assinalável. Se pensarmos que o filme foi filmado em 2D e só depois convertido para 3D, é caso para dizer que Burton preocupou-se em dar profundidade às imagens e não à narrativa e, no final, o seu filme é tudo menos maravilhoso, mas sim... vulgar.

 

Qualidade da banha: 8/20

 

publicado às 20:20


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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