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A Dama de Ferro

por Antero, em 09.02.12

 

The Iron Lady (2011)

Realização: Phyllida Lloyd

Argumento: Abi Morgan

Elenco: Meryl Streep, Jim Broadbent, Alexandra Roach, Anthony Head, Olivia Coldman, Richard E. Grant
 

Qualidade da banha:

 

Numa das melhores cenas de A Dama de Ferro, uma envelhecida Margaret Tatcher (Streep) reclama com o seu médico sobre a perceção de que o mundo atual preza mais o sentimentalismo do que atitudes firmes e ponderadas – um momento que nos permite vislumbrar as motivações da antiga primeira-ministra do Reino Unido e percebemos que, nem no crepúsculo da sua vida, Tatcher não se arrepende de certas políticas por fazer o que achava correto. Pena que cenas assim sejam tão poucas e estejam tão dispersas ao longo do filme e mesmo a dissertação da protagonista sobre o ato de "pensar" não possa aplicar-se à realizadora Phyllida Lloyd e à argumentista Abi Morgan.

Biografia da mulher que comandou os rumos do Reino Unido ao longo de 11 anos, A Dama de Ferro peca por ser apenas uma coletânea dos "melhores momentos" costurados sem a mínima elegância ou relação entre si: vemos a jovem Tatcher (Roach) como a humilde filha de um merceeiro e a sua filiação no Partido Conservador (onde era olhada com desdém), acompanhamos a sua candidatura e eleição para o cargo-mor em Downing Street, o braço de ferro com os sindicatos, a Guerra das Malvinas e o volte-face dos seus colegas partidários que levou à sua resignação – uma narrativa naturalmente episódica que Lloyd e Morgan não conseguem contornar. Para piorar, o filme perde um tempo precioso com longas conversas entre uma quase demente Tatcher e o falecido marido (Broadbent) sem que estas tragam algo relevante e até as divagações pelas suas memórias é feito de maneira canhestra (para introduzir o conflito com a Argentina, Tatcher é surpreendida por... uma pequena escultura de um soldado!).

Não que A Dama de Ferro fosse obrigado a tomar uma posição em relação a Tatcher, mas isso não justifica a apatia que permeia o filme. Conservadora até ao tutano e com espírito trabalhador, Tatcher era uma mulher implacável que pouco ou nada vacilava frente às adversidades, mas aqueles que não conheceram os seus feitos ou não têm uma opinião formada não encontrarão aqui razões que os levem a conhecer a fundo a personalidade da antiga ministra: umas vezes, o filme contrasta a sua imagem colorida e feminina num meio machista (como um corpo estranho àquele ambiente), mas sem retratar que ela provavelmente inspirou outras mulheres a seguir carreira política (ela está sempre rodeada de homens); noutras ocasiões, Tatcher é pintada como um ser mesquinho sem ideias próprias, dando a impressão que as suas ressalvas quanto à emergente União Europeia e a defesa do imposto comunitário (fatores que levaram à sua decadência) são fruto de pura teimosia.

Dona de uma carreira impar e de um talento capaz de elevar obras fadadas ao esquecimento como O Diabo Veste Prada e Julie e Julia, Meryl Streep é mesmo o destaque da produção, ainda que os seus esforços não consigam salvar A Dama de Ferro da mediocridade. A sua atuação é estupenda: vai aos mínimos detalhes como a voz e os maneirismos de Tatcher, mas ultrapassa a caricatura ao dar-nos uma mulher imponente, plenamente capaz de ocupar um cargo de tamanha responsabilidade mesmo que trave uma batalha constante para provar o seu valor perante os seus colaboradores, o povo que a elegeu e até a sua família, que ressente a sua posição (um tópico mal explorado pelo argumento). Streep não só encandeia aqueles que a acompanham (até o excelente Jim Broadbent é ofuscado) como também o próprio filme acaba por empalidecer diante da veterana atriz, visto que não está à altura de tamanho trabalho de precisão e brilho da sua protagonista.

Encerrando-se desajeitadamente com uma rima dramática fútil e preconceituosa (Tatcher seria uma pessoa melhor na cozinha), A Dama de Ferro funciona como uma colagem mal feita de eventos significativos que não encontram reflexo na vida privada de uma idosa Tatcher, num esforço inglório para dar relevância e emoção a uma narrativa inerte que se assemelha a um sensaborão relato de uma página da História.

Pelos vistos a Wikipédia agora produz filmes.

 

publicado às 18:17


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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