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A Árvore da Vida

por Antero, em 30.05.11

 

The Tree of Life (2011)

Realização: Terrence Malick

Argumento: Terrence Malick

Elenco: Brad Pitt, Jessica Chastain, Hunter McCraken, Tye Sheridan, Laramie Eppler, Sean Penn
 

Qualidade da banha:

 

A Árvore da Vida é mais do que um filme: é uma experiência sensorial única, exigente e arrebatadora. O obreiro é Terrence Malick, um realizador que conta com apenas cinco longas-metragens ao longo de quatro décadas, conhecido pelas suas "extravagâncias", de trabalhar à margem do sistema dos grandes estúdios e, como não podia deixar de ser, de não se reger pelo convencionalismo – e serão muitos aqueles que acusarão este A Árvore da Vida de ser pretensioso, inócuo e limitado na mensagem religiosa que pretende transmitir. Afinal do que trata o filme? A resposta não é fácil e poderá variar consoante o espectador. Tal como nas obras de Kubrick, as avaliações dependerão muito da bagagem emocional e intelectual que a própria pessoa leva na visualização do filme. O certo é que o filme faz uma analogia espiritual entre o núcleo da família O'Brien na América dos anos 50 e o nascimento e desenvolvimento do Universo, a começar pelo Big Bang.

 

Introspectivo e com um ritmo lento (o que levará os menos pacientes ao desespero), A Árvore da Vida dá-nos a conhecer Jack O'Brien na actualidade: sujeito distante e amargurado, ele relembra a sua infância junto dos pais e dos seus dois irmãos mais novos, um dos quais viria a falecer aos 19 anos. Criado num lar dominado com mão de ferro por Mr. O´Brien, Jack entra em rota de colisão com o progenitor devido ao seu carácter disciplinador que, aos poucos, vai drenando qualquer traço de espontaneidade e criatividade das crianças que encontram o seu porto seguro na figura da mãe. Ao mesmo tempo, somos apresentados à evolução do Universo até ao surgimento do planeta Terra e das primeiras formas de vida.

 

Profundamente religiosos, os O'Brien agarram-se às suas crenças como forma de extravasar o seu luto pelo filho falecido e tentar encontrar uma justificação para a tragédia. O que eles não parecem interiorizar (algo natural) é a aleatoriedade do Universo: assim como o Big Bang simplesmente aconteceu (ou seja, não tem uma explicação concreta), não há resposta ao "porquê?" da tragédia que se abateu sobre eles. Faz parte da natureza humana procurar razões para o desconhecido (foi com base nestes pressupostos que nasceu a Ciência) e, no entanto, o ser humano ainda tenta preencher os buracos deixados pelo que não se consegue explicar: acreditar numa entidade superior (seja Deus, Alá ou outro qualquer) dá um certo alívio e compreensão para a nossa existência. Daí até às contradições vai um salto: como alguém tão bondoso pode causar tanto mal? Porque é que me aconteceu isto, logo eu que sigo todos os desígnios?

 

Estes questionamentos encontram reflexo a um nível microscópico na família O'Brien: da alegria do casamento aos nascimentos dos filhos, o ambiente familiar antes saudável dá lugar à autoridade e à severa educação de Mr. O'Brien quando Jack começa a entrar na adolescência. Aos poucos, a revolta vai tomando conta dos filhos (com o mais velho à cabeça) ao passo que Mrs. O'Brien se torna cada vez mais apática e receosa do marido. Contudo, nem por um momento duvidamos do amor de Mr. O'Brien pela família (graças à sensível prestação de Brad Pitt), mesmo que isto não o impeça de cometer actos cruéis para com estes por achar que a esta é a forma mais válida de os preparar para a vida adulta.

 

Tal como o cosmo é demasiado complexo para ser reduzido a uma simples explicação, também o ser humano é capaz de ter comportamentos contraditórios: ao ser repreendido pelo pai por uma tarefa mal executada, a reacção de Jack é dar-lhe um abraço sentido que denota a carência do rapaz por calor humano – uma acção que o pai reprime numa tentativa de não se vergar ao sentimentalismo. Ao lidar com a notícia da morte do filho e com o choque da esposa, ele não consegue soltar mais do que um arrastado "era um bom rapaz" que denota toda a destruição interior vivida na altura. São estes pequenos momentos que dão profundidade e relevância à relação entre os integrantes da família e como isto se revelará determinante no crescimento emocional dos filhos.

 

Filmado espectacularmente por Malick, a narrativa de A Árvore da Vida é composta por memórias e fragmentos das recordações de Jack: não admira que muitas cenas sejam extremamente curtas e revelam apenas detalhes como sombras, paisagens e objectos (a reconstituição da época é primorosa), como se fossem pormenores dispersos na mente de Jack. Ainda assim, é na sequência que retrata a evolução do Universo que o filme atinge um grau de fascínio e arrebatamento total, com as suas belas e elegantes imagens (seriam elas recordações do Criador?) e a evocativa banda sonora que faz com que tudo pareça um bailado plenamente orquestrado o que, claro, potencia ainda mais as imagens.

 

Capaz de provocar intensas e produtivas discussões filosóficas sobre o ser humano, o filme de Terrence Malick abre a porta a inúmeras possibilidades e mesmo que o desfecho possa desagradar a alguns pela tendência cristã do mesmo, eu encaro-o de acordo com o perfil daquela família e da sua idealização do que seria aquele momento em particular. No final, tal como a Terra, o Sistema Solar e até Universo, todos iremos falecer um dia, cumprindo aquilo que se espera: que nasçamos, que cresçamos, que morramos. Eventualmente todos conhecemos um fim e, mesmo assim, continuamos a viver.

 

publicado às 23:26


Alvará

Antero Eduardo Monteiro. 30 anos. Residente em Espinho, Aveiro, Portugal, Europa, Terra, Sistema Solar, Via Láctea. De momento está desempregado, mas já trabalhou como Técnico de Multimédia (seja lá o que isso for...) fazendo uso do grau de licenciado em Novas Tecnologias da Comunicação pela Universidade de Aveiro. Gosta de cinema, séries, comics, dormir, de chatear os outros e de ser pouco chateado. O presente estaminé serve para falar de tudo e de mais alguma coisa. Insultos positivos são bem-vindos. E, desde já, obrigado pela visita e volte sempre!

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