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Tenho muita estima por Tim Burton e os seus universos fantasiosos recheados de humor negro e até mesmo pelos seus filmes mais comerciais (considero o mal-amado Planeta dos Macacos espectacular), mas, desta vez, algo correu mal. Alice no País das Maravilhas é o pior filme de Tim Burton em muito tempo, provavelmente o pior que ele já realizou, onde abundam os efeitos especiais e os cenários maravilhosos, porém tudo sem alma, sem chama, sem o sentido de maravilhamento que deveria estar presente numa adaptação da obra de Lewis Carroll e que Burton trata com o descaso típico do realizador que se rendeu aos devaneios proporcionados pela tecnologia digital. É menos um filme de Tim Burton, mas mais um filme Disney com umas pitadas do realizador de obras como Ed Wood, Eduardo Mãos-de-Tesoura, O Estranho Mundo de Jack ou A Noiva Cadáver.
Desenvolvido como uma espécie de sequela das obras literárias Alice no País das Maravilhas e Alice Através do Espelho, o filme conta com Alice já com 19 anos e prestes a casar com um lorde, num arranjo proporcionado pelas famílias de ambos. Quando deve aceitar o pedido de casamento, a jovem hesita e acaba por fugir, indo parar à toca de um coelho, entrada para a Sub Terra ("Underland" no original e não "Wonderland", num detalhe imbecil acrescentado pelo argumento) onde reencontra o Coelho Branco, os gémeos Tweedledee e Tweedledum, a Lagarta Azul, o Gato Cheshire e o extravagante Chapeleiro Louco. No entanto, Alice não se recorda das aventuras anteriores e agora terá de fazer frente à Rainha Vermelha (numa mistura desta com a Rainha de Copas) que se apoderou do trono e devolvê-lo à irmã desta, a Rainha Branca, para que a felicidade volte a reinar no País das Maravilhas.
Pensaram em Hook? Pois bem, a base é praticamente a mesma, só que o desenvolvimento está mais para A Bússola Dourada ou As Crónicas de Nárnia: o Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa e tantos outros sub-Senhor dos Anéis que invadiram os ecrãs nos últimos anos. E dá-lhe música épica (Danny Elfman volta a entregar uma partitura fraca), panorâmicas das personagens enquanto percorrem pastos, planícies e montanhas e, para não fugir muito à regra, uma história ancestral do Escolhido contra as forças malignas. Aqui, Alice terá de recuperar a mítica Espada Vorpal para matar um dragão qualquer (esqueci-me do nome) e destronar a Rainha Vermelha. Sim, o argumento é assim tão linear e pouco ambicioso.
Por outro lado, o País das Maravilhas (ou Sub Terra como o filme insiste em chamar) é belíssimo, mas Burton nunca nos dá a oportunidade de nos envolvermos naquele universo, deixando que os cenários majestosos façam o trabalho por ele. Ou seja, tudo o que tão bem resultou emAvatarnão se aplica aqui. Mas o mais decepcionante é que Burton abandone o surrealismo e a inteligência da obra de Carroll para abraçar uma aventura de grande escala, onde nem o charme das personagens secundárias recupera a essência original, uma vez que é notória a inclusão do Chapeleiro como personagem importante e não tanto periférica como justificação para o apelo comercial de Johnny Depp.
E por falar em personagens importantes, o facto de Alice estar mais crescida não faz diferença alguma no resultado final, já que ela demonstra uma inocência incomum para uma jovem de 19 anos, sendo ainda prejudicada pela fraca actuação de Mia Wasikowska que, além de inexpressiva, surge pouco à vontade no meio de tanto cenário digital (e a cena em que ela se belisca por achar que aquilo tudo é um sonho é, no mínimo, embaraçosa). Ainda assim, Helena Bonham Carter resgata o espírito da Rainha de Copas com imenso sucesso, sendo ainda auxiliada pelos excelentes efeitos especiais que lhe aumentam a cabeça de forma absurda para um corpo tão esguio. Quanto a Johnny Depp, o actor acrescenta mais uma personagem excêntrica à sua já longa galeria, embora não saia do piloto automático, ao passo que Anne Hathaway mal tem tempo para fazer seja o que fôr com a Rainha Branca.
Com poucos momentos do humor negro que caracterizam a obra de Tim Burton (os animais vassalos da Rainha ou as cabeças flutuantes que auxiliam Alice a atravessar um leito são momentos isolados), Alice nos País das Maravilhas falha ainda ao não estabelecer nenhum arco dramático para a sua protagonista que, ao final da projecção, não sofre nenhuma mudança assinalável. Se pensarmos que o filme foi filmado em 2D e só depois convertido para 3D, é caso para dizer que Burton preocupou-se em dar profundidade às imagens e não à narrativa e, no final, o seu filme é tudo menos maravilhoso, mas sim... vulgar.
Qualidade da banha: 8/20