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Mais um final de ano, mais uma vez a já tradicional lista de melhores e os piores filmes estreados em Portugal em 2011, segundo a minha opinião.
1
Cisne Negro
Black Swan
Um estudo intensivo sobre a Arte, uma jornada emocional arrebatadora, um thriller psicológico impecável e uma Natalie Portman num verdadeiro tour de force.
2
A Árvore da Vida
The Tree of Life
Definitivamente não é para todos, mas o novo de Terrence Malick é mais do que um filme: é uma experiência única, profunda e simbólica e que abarca temas prosaicos como a família, a educação e a adolescência, e outros mais filosóficos como Deus, a natureza humana, o sentido da vida. Pode custar a ver, mas é altamente recompensador.
3
Sangue do Meu Sangue
Sangue do Meu Sangue
É o regresso de João Canijo à boa forma e com mais um relato do Portugal contemporâneo, da família suburbana, com ocupações banais e preocupações quotidianas. Sangue do Meu Sangue é também uma ode ao feminismo e à maternidade num elenco com prestações brilhantemente homogéneas e encabeçado pela enorme Rita Blanco a destilar todo o seu imenso e reconhecido talento.
4
Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro
Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro
Menos trepidante na ação, mas mais intenso do ponto de vista narrativo, Tropa de Elite 2 faz o que só as melhores sequelas fazem: aprofunda a questão, explora novas possibilidades e dá seguimento lógico à trama.
5
X-Men: O Início
X-Men: First Class
A premissa não era nada de especial (oh, uma prequela!), o marketing só metia água (havia uns cartazes medonhos) e o filme não prometia muito. No entanto, a realização segura de Matthew Vaughn aliado a um argumento inteligente e ambicioso deram-nos um dos melhores filmes de super-heróis dos últimos anos, com fascinantes e carismáticas personagens, discussões maduras e adultas sobre integração e diferença, e espetaculares sequências de ação.
6
Indomável
True Grit
Mais uma obra que comprova a versatilidade dos Irmãos Coen e da capacidade da dupla em adaptar-se às necessidades de cada projeto, Indomável é também ainda melhor que a obra que refilma graças a personagens ambíguas, à revelação Hailee Steinfeld e uma belíssima fotografia de Roger Deakins.
7
Nos Idos de Março
The Ides of March
Depois do louvável liberalismo de Boa Noite e Boa Sorte, George Clooney não parece tão preocupado com intrigas políticas, mas sim com o processo de corrupção dos príncipios de um jovem promissor nas agerridas campanhas presidenciais. Recheado de personagens inteligentes que mergulham em situações complexas, Nos Idos de Março pode ter pouco a dizer sobre o processo eleitoral norte-americano (ou português, ou francês,...), mas não deixa de ser um entretenimento sólido e intrigante.
8
A Melhor Despedida de Solteira
Bridesmaids
Não deixa de ser irónico que o melhor filme vindo da casa de produções de Judd Apatow tenha mulheres como centro absoluto da narrativa. Pois é, isto é Bridesmaids: uma comédia hilariante, com situações construídas de maneira genial, e onde a carismática Kristen Wiig mostra que tem tudo para explodir em Hollywood.
9
Rango
Rango
Ano para esquecer para a Pixar, a melhor animação do ano é este fabuloso Rango, uma inusitada e divertida homenagem ao western, recheado de metalinguagem, um excelente design de produção, um ótimo elenco de vozes e sequências de ação inventivas e cativantes.
10
O Código Base
Source Code
Uma ficção científica exemplar (e que falta nos têm feito): apresenta um conceito interessante, explora-o a fundo e, melhor, apresenta questões de fundo filosófico-existencial enquanto cria personagens complexos.
Outros destaques de 2011, por ordem alfabética:
50/50
Blue Valentine - Só Tu e Eu
O Castor
O Deus da Carnificina
Despojos de Inverno
Drive - Risco Duplo
Enterrado
Harry Potter e os Talismãs da Morte: Parte 2
Splice - Mutante
Provavelmente estão a sentir falta nesta (ou até na próxima) lista dos últimos de Woody Allen, Pedro Almodóvar ou de Lars von Trier. O problema é que não consegui vê-los a tempo do final do ano e certamente que eles teriam lugar nesta listagem.
-10
A Rapariga do Capuz Vermelho
Red Riding Hood
Catherine Hardwike, realizadora do primeiro Twilight, decidiu fazer um Crepúsculo só dela ao reinventar a história de Capuchinho Vermelho. O resultado: uma salada indigesta de contos de fadas, desejos ardentes, carinhas larocas, diálogos risíveis e um Gary Oldman a dar tudo de si para escapar à vergonha. E um elefante gigante dourado inexplicável.
-9
Invasão Mundial: Batalha Los Angeles
Battle: Los Angeles
Os aliens mais miseráveis da galáxia perseguem os nossos heróis escondidos em edifícios para, mais tarde, escaparem como puderem e resguardarem-se noutra estrutura a salvo dos extraterrestres. Por quase duas horas!
-8
Cuidado Com o Que Desejas
The Change-Up
Jason Bateman e Ryan Reynolds numa comédia cujo maior feito é não ter uma única piada memorável. Minto: é bem capaz de ter a dupla de bebés mais bizarra e assustadora que alguma vez vi e que, daqui a uns anos e com agentes de jeito, estarão no próximo O Génio do Mal.
-7
Conan, o Bárbaro
Conan, the Barbarian
Trouxeram a personagem do limbo com mais sangue, violência e um espírito mais próximo das origens e... pffff! A história é um engodo, o ritmo é digno de um Príncipe da Pérsia (não é um elogio) e Jason Momoa talvez consiga carregar o filme pelos músculos, mas nunca pelo carisma. E por que fala ele como se estivesse a precisar urgentemente de Mebocaína?
-6
Dylan Dog: Guardião da Noite
Dylan Dog: Dead of Night
Produção que assentava melhor no canal SyFy do que no grande ecrã, a adaptação de uma banda desenhada de culto é um esforço inglório e aborrecido que mistura desajeitadamente comédia e terror numa narrativa incompreensível e recheada de clichés.
-5
As Viagens de Gulliver
Gulliver's Travels
Jack Black a fazer de Jack Black não é necessariamente mau, mas num filme que descura história a favor de efeitos especiais (que nem são tão especiais assim) e piadas desinspiradas não há talento cómico que nos valha.
-4
O Turista
The Tourist
Um embaraço a todos os níveis, este filme crê que juntar duas estrelas de Hollywood é o suficiente para garantir o sucesso. O argumento é anedótico, os cenários reais são desaproveitados, o ritmo é sonolento, mas a prova maior da incompetência de O Turista é o facto de que a química entre Johnny Depp e Angelina Jolie é inacreditavelmente nula.
-3
Transformers 3
Transformers: Dark of the Moon
Mais duas horas e meia de agonia patrocinadas por Michael Bay e seus companheiros: ação descerebrada, estereótipos a fazerem de personagens, meio de recrutamento militar, overdose de efeitos especiais, mil cortes por minuto, câmaras lentas, planos circulares, filtros amarelos, gajas boas, e – a assinatura do realizador – um fiapo de história.
-2
Engana-me Que Eu Gosto
Just Go With It
Outro ódio de estimação, as parcerias de Dennis Dugan e Adam Sandler já se tornaram uma rotina anual, uma fonte de prazer em si mesmo e até me ajudaram a conhecer melhor: há um claro sadismo da minha parte em ver estes atentados (ia escrever "comédias", mas não tive coragem) só para ver o fundo do poço ganhar ainda mais profundidade. Dificilmente haveria coisa pior este ano, mas eis que...
-1
A Saga Twilight: Amanhecer – Parte 1
The Twilight Saga: Breaking Dawn – Part 1
Todos sabem o quanto abomino os filmes Twilight, mas as fãs vão ter de ter paciência que este novo capítulo é indefensável. É uma porcaria. Uma perda de tempo. O pior dos quatro. Vou repetir: o pior... dos quatro! Conseguem perceber o quão abjeto é este filme? Eu não esperava muito, mas duas horas depois estava afundado na poltrona do cinema com vergonha alheia. Vou temer pela minha sanidade quando o próximo estrear já que pior não pode ficar! Assim espero... ou o Hospital Magalhães Lemos será o meu destino.
Outros destaques (pela negativa) de 2011, por ordem alfabética:
Arthur
Carros 2
Chefes Intragáveis
Green Hornet
Hereafter – Outra Vida
Killer Elite – O Confronto
O Ritual
Sem Tempo
Transgressão
Momentos marcantes (para o bem e para o mal) do ano cinematográfico:
Bom ano e bons filmes!
ALERTA DE SPOILER! Este post contém informações relevantes, pelo que é aconselhável que só leiam caso estejam a par da exibição norte-americana.
Dexter: temporada 6
Oh, God! – exclama Dexter antes de encerrar o seu sexto ano. Que bosta de final! E de temporada! – acrescento eu.
Seria de esperar que a série quisesse recuperar-se da fraca temporada anterior e os rumos até apontavam nesse sentido: a discussão sobre religião trazia um seguimento lógico a uma personagem que busca algum tipo de redenção e de integração numa sociedade na qual tem de ocultar e redirecionar constantemente a sua essência. A figura de Brother Sam, um indivíduo que encontrou na Fé a salvação para um passado criminoso, oferecia o contraponto necessário para a postura cética do nosso anti-herói enquanto Travis e Geller estabeleciam-se como vilões eficientes, mas nada digno do Trinity de John Lithgow (já lá vamos à grande "revelação" da temporada). Nisto, Brother Sam é assassinado e, ao vingá-lo num momento de raiva absoluta, Dexter é acometido pelo lado negro do seu Passageiro Sombrio, antes suavizado pela figura paterna, e agora controlado pela imagem do seu irmão, o Ice Truck Killer. Pena que durou tão pouco.
Em tantos aspetos que me incomodaram, este foi um deles: a tendência da narrativa não mergulhar a fundo nas suas ideias. A discussão religiosa ficou pela superfície, talvez por receio de irritar uma parcela do público, e mesmo o facto de ver um Dexter tomado na íntegra pelo seu instinto homicida foi resolvido num capítulo. Pior que isto, só deixar narrativas pelo meio, num puro desperdício de tempo e de talento do elenco: o imbróglio de Matthews serviu para provar a idoneidade de Debra e o jogo sujo de LaGuerta, mas e daí? Batista e Quinn pareciam saídos de uma comédia policial, o novo detetive não serviu para nada, a irmã do Batista e o estagiário do Masuka ocuparam mais tempo do que deveriam e nem quero pensar que este está a ser preparado para ser o próximo vilão apenas por... não conseguir impressionar o Dexter! Até atentados terroristas tivemos este ano. Cruzes!
Nada disto se compara à imbecilidade de criar uma trama romântica entre os irmãos Morgan. Tudo bem que eles não irmãos biológicos, mas – que caraças! – eles foram criados juntos desde cedo! E nada disto foi minimamente abordado nos últimos anos. De onde surgiu isto, então? Ora, da necessidade de estabelecer um conflito em Debra aquando a sua descoberta do segredo do irmão, talvez por que amor fraternal não seria suficiente nas cabeças acéfalas de quem idealizou tamanha cretinice. E dá-lhe sessões com a terapeuta menos articulada da História (deu saudades de In Treatment) capaz de convencer a pobre Debra que a sua dependência do irmão é... amor! E dá-lhe quase orgasmos na presença de Dexter! Chiça, penico!
Quanto à revelação que Gellar é uma alucinação de Travis, bem... desconfiei logo no primeiro capítulo. Afinal, se Dexter tem o seu pai para o auxiliar, não seria descabido pensar que um novo assassino poderia ter um semelhante. No entanto, uma mera suspeita tornou-se algo ridiculamente óbvio ao arrastarem a questão semanas a fio e tornou-se vergonhoso perceber que Travis, desenvolvido como um sujeito normal levado a cometer atrocidades em nome da Fé (um tópico corajoso e ambicioso), logo foi transformado num psicopata esquizofrénico caricatural igual a tantos outros - uma solução covarde e preguiçosa. E que me perdoem aqueles que gostaram de Debra ter descoberto que o irmão é um assassino, mas eu gostaria que a situação tivesse sido construída com mais cuidado e não que ela decida, do nada, declarar-se para o irmão... e numa cena do crime! Ou seja, isto veio com uma temporada de atraso, o que aumenta mais a minha irritação com os caminhos que Dexter tomou nos últimos dois anos.
Não posso deixar de referir aqui os numerosos momentos constrangedores que rechearam esta temporada e cá vão eles:
Acho que já chega.
Não nego que a próxima temporada tem um potencial enorme, mas receio que os produtores vão arranjar novas formas de estragar tudo em vez de levá-la a bom porto. O Dexter que conheciamos está agora no Paraíso das Séries juntamente com LOST, Seinfeld, Friends e Os Sopranos. Amputada de dois membros, é certo, mas eu estou em crer que lá em cima também se preocupam com questões de acessibilidade.
Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.
ALERTA DE SPOILER! Este post contém informações relevantes, pelo que é aconselhável que só leiam caso estejam a par da exibição norte-americana.
Homeland: temporada 1
Há várias semanas que queria escrever sobre Homeland, sobre o prazer que ela me devolveu em acompanhar uma série todas as semanas, isto numa altura em que as estreias não chamam a atenção (American Horror Story?! Terra Nova?!), em que as de longa data apresentam imenso desgaste (How I Met Your Mother, House) e ainda outras que vão ladeira abaixo (Dexter foi particularmente penoso de assistir, mas isso fica para outro texto). Esfriei os ânimos e decidi esperar pelo final, não fosse desapontar-me a valer. Felizmente, isso não aconteceu. Pode ser difícil de acreditar, mas desde o primeiro ano de LOST que eu não via uma temporada de estreia tão absorvente, intensa e viciante.
Baseado num original israelita, Homeland começa com o regresso do sargento Nicholas Brody de regresso aos EUA após um cativeiro de oito anos no Iraque como prisioneiro de guerra da Al-Qaeda. De regresso a uma família que já havia seguido o seu rumo sem o patriarca, Brody é encarado como um herói por todos exceto a agente Carrie Mathison, que tem a informação de que um militar norte-americano foi convertido ao Islamismo e aos dogmas da organização terrorista. Trabalhando diretamente com Saul Berenson, que serve como mentor, Carrie fará tudo para provar que um ataque aos EUA é iminente ao mesmo tempo que lida com questões pessoais que podem pôr em causa a sua competência profissional e, pior ainda, a sua sanidade.
Ou seja, Brody pode ou não ser um terrorista, Carrie pode ou não estar certa ou, pelo menos, não completamente. Assim, somos atirados de cabeça num jogo de gato e rato, cheio de reviravoltas, traições e onde nada é o que parece. Se isto não soa especialmente inovador para quem já viu Prison Break ou 24 (com a qual divide alguns produtores), Homeland mergulha fundo na mente daqueles indivíduos e percebemos os seus desejos, os seus medos e as suas contradições. Carrie é astuta, determinada e inteligente, mas não será a sua instabilidade psicológica acentuada por anos e anos de trabalho árduo na CIA? Ou é a sua particularidade que a torna numa profissional tão competente? Por outro lado, Brody vê-se num mundo onde não se encaixa, rompe com a dinâmica familiar estabelecida na sua ausência e tem comportamentos estranhos. Será mesmo um terrorista? Ou terá se convertido como mecanismo de defesa?
Ao desenvolver as suas personagens cuidadosamente, Homeland faz com que nos preocupemos com cada uma delas e as consequências dos seus actos, enquanto aumenta a tensão em cenas compostas por confrontos verbais ou um simples teste do polígrafo. Além disso, a série não pinta a CIA como uns santos em defesa da pátria e ilustra bem as motivações dos terroristas bem como as ações destrutivas de ambas as partes em conflito – e é este clima de ambiguidade, em que nada é preto no branco em diferentes escalas, que torna a série tão fascinante e adulta. Mas o que realmente faz desta temporada de Homeland algo tão memorável é a sua ousadia em cruzar linhas que dávamos como certas e, deste modo, abrir toda uma janela de possibilidades – e, volto a repetir, este texto está cheio de spoilers, por isso é melhor parar de ler por aqui. Eu estou a avisar.
Eu avisei.
Continuando...
Quando Carrie e Brody se envolvem romanticamente no brilhante sétimo episódio, a narrativa faz aquilo a que poucas se atreveriam ou, pelo menos, não tão cedo. Sem o auxílio da vigilância ilegal que instalara na casa do sargento, Carrie vê-se obrigada a revelar-se e a conviver com o suspeito que logo se revê no seu caráter autodestrutivo, já que ele próprio está em vias de perder tudo aquilo que tinha. Ela, no entanto, vê nele alguém que preencha o vazio da sua carência emocional e ambos estabelecem um vínculo fugaz, mas marcante. Ela comete um erro, abre o jogo e a série responde a um monte de perguntas que outro produto televisivo arrastaria durante semanas. Aquele fim de semana, contudo, fornece dados que Carrie usará no último episódio para indiretamente (e sem saber) prevenir o ataque terrorista que Brody levara a cabo. A história pode tomar algumas direções bizarras e improváveis, mas, se formos a pensar bem, elas surgem lógicas e condizentes com as personalidades daqueles indivíduos.
A encabeçar um elenco de prestações homogéneas, Claire Danes dá um verdadeiro espetáculo como a decidida Carrie ao dominar todas as facetas da personagem: o génio forte, a instabilidade, a inteligência, a sagacidade, o descontrolo e uma certa vulnerabilidade (e a atriz é inteligente ao abraçar os traços menos atraentes de Carrie sabendo que o sucesso desta não depende da simpatia irrestrita do espectador). Dispensava-se era a narração sobre a sua ineficácia em impedir o 11 de Setembro, uma vez que custa acreditar que a jovial Carrie fosse um agente influente aos vinte e poucos anos, mas em tudo o resto Danes é dinamite pura. E mais: com o carismático Mandy Patinkin, ela estabelece uma dinâmica de pai e filha genuína e que nos leva a temer pela mesma devido às ações impensadas dela. Damian Lewis também brilha a grande nível como o ambíguo sargento Brody e Morena Baccarin destaca-se como a sofrida esposa que tenta endireitar a vida com a chegada do marido desaparecido.
No final, com Brody em direção à política e Carrie a submeter-se a um tratamento de choque, Homeland planta as sementes do já anunciado segundo ano. Porém, tirando uns pozinhos aqui e ali, este seria o final perfeito caso estivesse a falar de uma minissérie, já que os arcos dramáticos deles foram, de certa forma, satisfatoriamente resolvidos: ele em relação à família e à sua missão; ela em relação à doença. Posso até apostar que a próxima temporada não estará ao nível desta, mas estou em pulgas para saber que cartas é que os argumentistas têm na manga. Mesmo assim, fica a memória de 12 maravilhosos capítulos que fazem da temporada algo envolvente, instigante, conciso e perfeito.
Homeland estreia em janeiro na FOX e prepara-se para arrebatar vários prémios nos próximos meses.
Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.
Mission: Impossible - Ghost Protocol (2011)
Realização: Brad Bird
Argumento: André Nemec, Josh Appelbaum
Elenco: Tom Cruise, Jeremy Renner, Paula Patton, Simon Pegg, Michael Nyqvist, Anil Kapoor, Josh Holloway
Qualidade da banha:
Quem diria que Brad Bird, o homem que realizou as maravilhosas animações O Gigante de Ferro, The Incredibles e Ratatouille, seria a escolha ideal para mais um capítulo da série cinematográfica Missão Impossível? Escolha insólita, é certo, mas depois de ver este trepidante Operação Fantasma não há como negar que a aposta foi um enorme acerto. Cada um dos filmes anteriores tinha a marca dos seus realizadores: o tom conspiratório de De Palma, a ação vertiginosa (e, pelo menos naquela obra, enjoativa e ridícula) de John Woo e um clima mais próximo da aventura de um J.J. Abrams saído da televisão, mas apenas este último soube contornar os argumentos pífios já característicos da série – e o mesmo acontece aqui, uma vez que a história é um mero caderno de encargos para as sequências de ação que são absolutamente espetaculares.
Anos depois dos eventos do terceiro filme, Ethan Hunt (Cruise) é resgatado de uma prisão russa pelos companheiros Benji Dunn (Pegg) e Jane Carter (Patton) e o trio terá como missão invadir o Kremlin para recuperar os ficheiros relacionados com o terrorista Cobalt (Nyqvist) que poderá estar na posse de códigos secretos que ativarão uma bomba nuclear – ou algo assim do género, visto que estes dados funcionam como autênticos MacGuffins, um conceito consagrado por Hitchcock: é algo que mantém a história em andamento, é perseguido por todas as personagens, mas não tem relevância para a trama além do facto de ser algo considerado “importante”. Quando as coisas dão para o torto em Moscovo, a IMF é desacreditada e o Governo norte-americano ativa a "Operação Fantasma", que visa extinguir toda a agência de espiões. Hunt e a sua pequena equipa terão de agir por conta própria para limpar os seus nomes e impedir um novo ataque.
Eficiente do ponto de vista narrativo, o destaque de Operação Fantasma reside mesmo nas cenas de ação que Bird conduz com uma segurança impressionante que em nada fica a dever ao bom trabalho de Abrams no terceiro episódio – e eu poderia dedicar cada parágrafo deste texto a cada uma delas tamanho é o efeito que provocam na plateia. Montadas de forma ágil e com uma clareza de ideias que permite ao espectador perceber o papel de cada um dos intervenientes e o espaço onde se inserem, elas ainda contam com o bónus de empregar os equipamentos típicos franquia de maneira engenhosa e divertidamente absurda (o meu favorito é aquele usado para enganar um segurança do Kremlin). E se a sequência em que Hunt escala o Burj Khalifa é digna de aplausos, também aquela que retrata uma importante troca de informações em pisos diferentes desse edifício merece ser salientada pela tensão que desperta.
Demonstrando mais uma vez todo o seu carisma, Tom Cruise encarna Hunt com a dedicação habitual (quase obcessiva) e poucas são as estrelas em Hollywood que vestem tão bem a camisola para este tipo de filmes. Por outro lado, ainda que seja o centro absoluto do filme (e da série), Cruise deixa espaço para os colegas de elenco brilharem ao seu modo: Paula Patton exibe uma sensualidade e um profissionalismo admiráveis, Simon Pegg fica sempre bem como alívio cómico e Jeremy Renner prova que poderá ser um ótimo substituto para Cruise caso a série siga adiante, além de aproveitar alguns momentos em que o filme exige mais de si em termos cómicos. O ponto fraco é mesmo o vilão do excelente Michael Nyqvist (da trilogia sueca Millennium), cuja falta de personalidade e planos mirabolantes fazem dele um inexpressivo antagonista que mais parece saído da galeria de inimigos de James Bond.
Enérgico e imparável desde o primeiro minuto, Missão Impossível: Operação Fantasma faz bom uso das localidades por onde passou, conta com efeitos especiais competentes (embora o chroma key por vezes deixe a desejar) e a banda sonora do meu adorado Michael Giacchino é vibrante e poderosa, ajudando a dar urgência às situações (isto para não falar nas boas variações sobre o marcante tema original de Lalo Schifrin). Ainda que Cruise esteja disposto a pendurar as botas (ou as armas, melhor dizendo), é refrescante perceber que a série pode seguir pelo próprio pé desde que tenha produtores dispostos a corresponder às necessidades da mesma. Bird, como o filme aponta, pode ter futuro para lá da animação.
Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.
Puss in Boots (2011)
Realização: Chris Miller
Argumento: Tom Weeler, David H. Steinberg, Brian Lynch
Vozes: Antonio Banderas, Salma Hayek, Zach Galifianakis, Billy Bob Thornton, Amy Sedaris
Qualidade da banha:
Depois de artisticamente secar a teta da série Shrek, a Dreamworks Animation volta à carga com um derivado protagonizado pela emblemática personagem surgida no segundo capítulo daquela franquia: o Gato das Botas. Apesar de não chegar aos calcanhares das animações computorizadas da casa (os dois primeiros Shrek e Como Treinares o Teu Dragão), é reconfortante perceber que o filme está muitos furos acima de disparates como Madagáscar ou Monstros vs. Aliens. O Gato das Botas é divertido e empolgante e, no fundo, isso é o que basta, talvez por que as expectativas não eram as melhores.
Como já se tornou habitual em Hollywood, a narrativa é uma história de origem: no país dos contos de fadas, vive o lendário Gato das Botas (Banderas), um corajoso felino possuidor de um génio peculiar e de uma coragem sem limites. Apesar da sua reputação em todo o reino, o seu carisma e sedução são postos à prova quando conhece Kitty Patas Fofas (Hayek), uma misteriosa gata mascarada, que não tenciona deixar-se levar em conversas e que ele descobre estar ligada a Humpty Alexander Dumpty (Galifianakis), um seu amigo de infância. Os três acabam assim envolvidos num plano de assalto a Jack e Jill (Thornton e Sedaris), dois terríveis bandidos na posse de um antigo poder que ameaça o mundo.
Sem contar a ambição temática e adulta que caracteriza as maravilhosas longas-metragens da Pixar, O Gato das Botas investe num clima de aventuras que homenageia os velhos filmes protagonizados por Errol Flynn ou Douglas Fairbanks ao mesmo tempo que ressuscita aquilo que fez a fama de Shrek (e consequentemente esquecido as sequelas): a subversão das histórias de encantar. O maior exemplo disto vem na personagem de Humpty Dumpty: solitário e com uma imaginação fértil (dois traços de personalidade engenhosamente desenvolvidos a partir do seu isolamento em cima de um muro), é dele que parte o plano mirabolante de usar os feijões mágicos como forma de dar relevância à sua existência e, mesmo que o filme não consiga estabelecer um arco dramático profundo, a personagem torna-se querida pela sua condição de rejeitado e pelo certeiro casting de voz de Zach Galifianakis que lhe fornece um misto de comicidade e drama que cai como uma luva.
Cheio de piadas referentes a gatos (sendo a da fixação por luzes a melhor), O Gato das Botas conquista o espectador com personagens carismáticas como o já citado Humpty Dumpty, a arisca Kitty Patas Fofas e, claro, o protagonista vocalizado por Antonio Banderas – e se o efeito 3D é bem trabalhado na profundidade dos cenário, embora parta para o óbvio (leia-se objetos lançados para o público), o filme encontra espaço para gags visuais inspiradas como aquela que envolve abutres e a divisão do ecrã ou a cena em que o vilão revela os seus planos e temos um rápido flashback que o situa em momentos-chave da história, numa paródia a tantos outras obras que usam este artifício.
Contando com sequências de ação bem montadas (a do Pé de Feijão chega a ser alucinante), O Gato das Botas surge como uma mistura de Zorro com d'Artagnan, exatamente como ele havia sido imaginado aquando a sua aparição em Shrek 2. E não posso deixar de salientar como aspeto positivo o facto deste filme me ter lembrado o divertimento e o charme que se viu nas duas primeiras aventuras do ogro verde. Só isto já faria de O Gato das Botas uma obra recomendável.
Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.